sábado, maio 31, 2003
FIM-DE-SEMANA: Vamos estar out este fim-de-semana. O PM foi para o Porto e estará presente amanhã, dia 1, na Feira do Livro do Porto (debate sobre poesia com Jorge Gomes Miranda, Luís Quintais, João Luís Barreto Guimarães e José Ricardo Nunes); o JPC anda a tratar do Isaiah Berlin como ainda ninguém o fez ainda e eu vou ver o mar que também é preciso. Bom fim-de-semana. PL
DURMAM BEM: O post de ontem, absolutamente necessário face a uma série de indignidades (muitas das quais se passaram fora dos blogs, e que por isso os nossos leitores não conhecem), foi o último em polémica directa com os «pensadores» da Nova «Democracia». Deixamos, a partir de agora, esses senhores sozinhos, a vociferar contra o sistema e a Constituição. Daqui não levam troco. Durmam bem. PL / PM
sexta-feira, maio 30, 2003
TAL COMO A PEDOFILIA? Li mal ou Miguel Sousa Tavares, no artigo que assina hoje no Público sobre a Casa Pia, escreve que transformar as escutas telefónicas num método de investigação rotineiro, é tal como a pedofilia, crime. É sem dúvida crime; mas não como a pedofilia. Porque não há crime como a pedofilia. Mais atenção à linguagem, senhores. PL
FUNDAMENTOS: Li o despacho (publicado no Indy) que ordenou a detenção e levantamento da imunidade parlamentar de Paulo Pedroso. Os fundamentos são frouxos, as ilações extraídas das escutas telefónicas muito discutíveis. Quero crer na existência de outros elementos, de outros indícios, mais sólidos, para justificar a prisão preventiva de Pedroso. O processo contra Pedroso não pode ser apenas isto. Apesar desta indistinta rede de circulação de informação, que envolve juízes, procuradores, políticos e a Felícia judiciária, insisto que não sabemos tudo. PL
TELENOVELA: A notificação ao domingo não foi de muito bom gosto, o «pode ser» do Procurador foi bastante bizarro mas este jornalismo de telenovela que anteceu a ida de Herman José ao DIAP atingiu o cúmulo do grotesco. Durante toda a semana, as televisões foram-nos dando xaroposas entrevistas a Herman, indagando do seu estado de espírito, visitando-o no restaurante, nos ensaios, procurando enternecer o público para o que viesse acontecer ao humorista. Como se Herman, em vez de ir depor num processo judicial, fosse tirar um rim ou uma verruga maligna. A encenação tem limites. PL
ISSO VEM EM QUE ARTIGO? Sampaio pede a famosa «serenidade», diz que estará atento, mas que, em última análise, tem poderes sobre todos os órgãos de soberania. Ok, o PR pode dissolver a Assembleia, demitir o Governo, mas o que pretenderá fazer com os tribunais? Constitucionalistas, por favor, expliquem-me o que vai na cabeça do Jorge. PM
BUSINESS AS USUAL: Mesmo que as coisas corram mal hoje na Tribunal de Instrução Criminal, o dr. Balsemão manterá o programa do nosso único humorista, embora com um nome novo: Herman TIC. PM
A VANGUARDA DIREITISTA: Era de esperar. Conhecemos a honestidade intelectual desta pandilha. Um blogger miguelista parodia um texto da Coluna; até aqui, nada de mal, a paródia é livre e aconselhável, mas o dito senhor não faz o respectivo link, para os leitores poderem confrontar o texto. Chama-se etiqueta, mas talvez esse senhor ainda não saiba os elementos básicos indispensáveis à comunidade bloggística. A sua intervenção é compreensível: o cavalheiro defende um partido, do qual é um dos pensadores (valha-nos Deus). Um partido Regenerador, no qual não haverá idiotas, corruptos, fontes anónimas, conspirações em sótãos, guerrilhas internas, bocas nos jornais, um partido, em suma, que não fará política. O monteirismo é essa patetice: um partido unicamente unipessoal, que nasce do revanchismo saloio, e que pretende, ó justos céus, corrigir os vícios da política portuguesa, começando a disparar sobre todos os órgãos de soberania, e mesmo prometendo um regime «novo» (sabemos qual). Lamentamos que nesse partido estejam duas ou três pessoas por quem temos estima, mas os outros, meus amigos, são uns direitosos do mais rasca que a direita produziu, liderados por uns intelectuais desocupados e esgroviados. A maralha monteirista não tem ideias: basta ver a paupérrima e vaga declaração de princípios. Estes intelectuais reaças têm: e sabemos muito bem quais são. A principal ideia das luminárias é a de que vivemos numa democracia a fingir, onde toda a gente é de esquerda, porque a direita, para eles, é evidentemente de esquerda. O PNR, ao menos, junta uns nostálgicos a valer, e pelo menos nostálgicos dum senhor que sabia escrever português. Os monteiristas, pelo contrário, são liderados intelectualmente por gente que gostava de ter o talento para a imprecação de um José Agostinho de Macedo, o nosso virulento reaccionário. Mas talento não ronda por aquelas paragens: é gente que julga que alguém se impressiona com grossas teses de doutoramento, com citações freneticamente cosidas, e com uma pose minoritária que julga que da minoria (da minoria ínfima) é que vem a razão. São a vanguarda direitista, esses grandes inimigos da esquerda que passam a vida a atacar e boicotar a direita, esses «puros», impolutos, essa gente que não suja as mãos, mas que manda piadas, indirectas, sem citar nomes, com uma desonestidade intelectual que bem conhecemos dos seus manuais grotescamente «eruditos». Sr. Prof. Maltez, quando se polemiza citam-se as pessoas com quem se polemiza; o contrário é cobardia. Nada que nós não saibamos. Daí, desse pântano a que provisoriamente chamam o «monteirismo» - até escolherem outro espantalho que vos sirva - já estamos habituados a uma coragem da boca para fora, portuguesinha, «agarrem-me senão bato-lhes». Mas nunca tiveram coragem para dizer o que realmente pensam, nunca tiveram coragem para dizer que querem Portugal fora da União Europeia, pobretes e alegretes, com jaquinzinhos e modinhas minhotas. E depois vêm com um pateta discurso de ressentimento social, de descamisados da treta, remetendo para as ideologias que bem conhecemos. E depois atacam os partidos do governo como indirecta para nós, os bloguistas da direita democrática, como se nós fossêmos paus-mandados deste ou de qualquer outro governo de direita. Leiam os nossos arquivos e o de outros blogs: nunca nos escusamos a criticar este ou qualquer governo de direita, sempre que achamos que procederam mal. Por isso, bocas ao PSD e ao PP devem ser endereçadas aos respectivos partidos. Os senhores pensam que nós não conhecemos a maralha que agora, provisoriamente, aderiu ao «monteirismo», que nunca jantámos à mesma mesa, que não sabemos o que acham deste regime, que não conhecemos os retratos que têm em casa, ou os líderes estrangeiros que veneram. Aqui na Coluna Infame repudiamos totalmente essa pseudo-vanguarda ignóbil, casca-grossa, que representa tudo o que de pior tem a direita em Portugal. Felizmente, o eleitorado não é parvo, e saberá dar-vos as décimas que merecem, e que depois regressem às vossas bibliotecas integralistas, poeirentas e com bustos, vociferando, à frente da mulher-a-dias, contra esta Pátria ingrata que não vos merece. E depois, bem sabemos, escreverão o livro imortal, colossal, que vai varrer com este gente toda, direitistas sem complexos nem taras autoritárias e toda a esquerda comedora de criancinhas. Trememos perante tal apocalipse. PL / PM
quinta-feira, maio 29, 2003
NÁUSEA: Reparem como Manuel Monteiro, numa penada, se atira ao Presidente, ao Procurador-Geral da República, à oposição e ao Governo. Nenhum órgão de soberania escapa ao seu dedo acusador. É um santo, este varão. Salva-se o povo mas o povo, vejam bem, o povo é vilipendiado pelo sistema. O povo não pode ser insultado. E, sabendo disto, sabendo da imundície do sistema, Monteiro não quer oprimir mais o povo. Monteiro precisa do povo. Em troca, oferece generosamente a sua virtude, a sua frescura, a sua originalidade. É um político novo, sem passado, sem vícios, sem outros interesses que não os da sua sanha reformadora. Há muito que a Pátria precisava de um político assim; de um político de ruptura que ponha termo a este marasmo de incompetência e promiscuidade. Eu humildemente afirmo desconhecer o que Manuel Monteiro pensa do sistema, do regime ou da política. Sei que pensa mal. Facto notório. Mas permito-me relembrar aqui uma curiosidade: Manuel Monteiro é um genuíno produto do sistema e do mesmo sistema que anda agora a criticar. Agremiações juvenis a brincar ao poder, partidos, votos comprados com política rasteira, eleições circenses, tacticismo parlamentar, conveniência acima das convicções políticas: é extraordinário como Manuel Monteiro passou por tudo isto, como Monteiro é um perfeito produto desta inglória misturada. Sem o sistema, Monteiro estaria em todo o lado menos na vida política, para a qual, de resto, não se lhe reconhecem méritos assinaláveis. Esta pose moral, esta juventude falsa, este portuguesismo tradicionalista, desculpem, causam-me náuseas. Náuseas. PL
DEMOCRACIA: Os milagres acontecem: numa livraria portuguesa, vejo um livro de Paul Johnson ao pé dos pensamentos de Mao Tsé Tung e outro de Bernard Lewis lado a lado com comrade Chomsky. Assim sim. PL
RECTIFICAÇÃO: Antes que chovam protestos, tenham em atenção que só contam livros (e prisões) de Almeida Santos posteriores ao 25 de Abril. Obrigado. PL
FINALMENTE: Segundo o Público de hoje, o Ministério Público enviou para o Tribunal Constitucional um parecer, considerando que a sigla ND, do novo partido político de Manuel Monteiro, se confunde com a sigla MD, do Movimento dos Doentes. Se não me está a escapar nada, eu não diria apenas que as siglas são confundíveis. Arrisco dizer que, para além dessa confusão, a Nova Democracia e o Movimento dos Doentes foram certamente fundados pelas mesmas pessoas. E ainda dizem que o Ministério Público não trabalha. PL
PRISÃO: Ontem, à saída da prisão de Lisboa, António Almeida Santos declarou aos jornalistas que «a prisão é o melhor sítio para se ler e escrever». Tem toda a razão. E, por isso, quem conheça algum dos numerosos livros do próprio Almeida Santos, só pode lamentar que ele nunca tenha sido preso. PL
HAND JOBS: Catarina Furtado em declarações a revista social: «Tenho uma óptima relação com o meu corpo». Mas não teremos todos? JPC
O CASO BELGA: Já aqui lembrámos, a propósito da pedofilia, o caso belga. Publicamos a seguir um testemunho, longo mas relevante, sobre essa situação, por um português que a presenciou in loco.
Concordo vivamente com uma abordagem comparativa entre a situação sócio-política gerada pelo actual processo de inquérito e o ocorrido em 97/98 na Bélgica.. Permitam-me que esclareça alguns pontos relativos a este último, baseando-me no facto de ter vivido em Bruxelas exactamente aquando da explosão mediática causada pela publicação dos hediondos eventos então ocorridos. Pois bem, tais crimes ocorreram algures numa cave duma residência localizada nas Ardenas, na qual o Sr Marc Dutroux e a sua esposa encarceravam crianças, obrigando-as a cometer perversos actos sexuais, assassinando-as brutalmente, dilacerando os seus corpos que eram depois estrategicamente enterrados no quintal. Tal facto terá ocorrido ao longo de qautro anos, mesmo após este casal ter sido dado como suspeito, aquando do desaparecimento duma menina de origem magrebina, tendo sido mesmo efectuada uma revista à sua residência sem que as infernais masmorras tivessem sido descobertas pelo agentes encarregues da investigação. As semelhancas comecam exactamente quando dois membros do governo belga da altura são indiciados como testemunhas, e posteriormente como arguidos, tendo-se assistido a uma escalada infame de nomes públicos ligados aos mais diversos sectores, desde políticos a diplomatas, jornalistas, economistas; se bem me lembro o processo chegou a ter mais de 300 testemunhas e 30 arguidos, um verdadeiro escândalo. Toda uma rede estrategicamente montada e revelada da forma mais brutal, clientes dos mais variados quadrantes socio-politicos contratam o casal para a realizacao de snuffs (pequenos filmes registando actos de índole sexual e violenta sobre crianças) pagos a peso de outro e distribuídos por toda a Europa. Esta situação levou a sociedade belga a organizar as Manifestacoes Brancas, únicas na história daquele país, nas quais chegaram a participar 200 mil cidadãos, valões, francófonos, germanófilos, envergando t-shirts simplesmente brancas como testemunho de indignação para com o lastimável processo. Dutroux é transferido de estabelecimento prisional, o seu julgamento é adiado sine-die, a justica é fortemente abalada por fugas estratégicas para o estrangeiro, o escândalo atinge altos magistrados da nação, e surpreendentemente, passados cerca de seis anos, apenas Dutroux se encontra encarcerado, tendo-lhe sido possível escapar por duas vezes aos calabouços por conveniências várias que ainda se encontram por explicar. Até a sua esposa teve pena atenuada, sendo-lhe possível efectuar visitas domiciliárias. A sociedade belga, estigmatizada pelas suas próprias divisões internas, nunca recuperou deste hediondo escândalo socio-político.
Em Portugal, lamento encontrar semelhanças no acompanhamento deste processo, muito especialmente pelos órgãos de comunicação social, onde ainda ontem, na RTP1 podemos presenciar, incrédulos, a perseguição, a pé, por parte duma jornalista, ao magistrado do TIC responsável pelo processo, inquirindo-o acerca de alguns pormenores suspostamente relevantes. Fugas de informação successivas desviam as atenções alimentando a autofágica euforia dos tablóides, altos magistrados proferem declarações inacreditáveis, agentes políticos lançam suspeitas sobre as próprias instituições responsáveis... Infelizmente, este tipo de atitude apenas prejudica todos aqueles que sofreram as provações físicas e psicológicas causadas por comportamentos doentios, as vítimas deste processo. Haja respeito por elas, pelo processo, pelas instituições, pelos arguidos, pelas testemunhas, por todos nós. (André Barbosa)
Concordo vivamente com uma abordagem comparativa entre a situação sócio-política gerada pelo actual processo de inquérito e o ocorrido em 97/98 na Bélgica.. Permitam-me que esclareça alguns pontos relativos a este último, baseando-me no facto de ter vivido em Bruxelas exactamente aquando da explosão mediática causada pela publicação dos hediondos eventos então ocorridos. Pois bem, tais crimes ocorreram algures numa cave duma residência localizada nas Ardenas, na qual o Sr Marc Dutroux e a sua esposa encarceravam crianças, obrigando-as a cometer perversos actos sexuais, assassinando-as brutalmente, dilacerando os seus corpos que eram depois estrategicamente enterrados no quintal. Tal facto terá ocorrido ao longo de qautro anos, mesmo após este casal ter sido dado como suspeito, aquando do desaparecimento duma menina de origem magrebina, tendo sido mesmo efectuada uma revista à sua residência sem que as infernais masmorras tivessem sido descobertas pelo agentes encarregues da investigação. As semelhancas comecam exactamente quando dois membros do governo belga da altura são indiciados como testemunhas, e posteriormente como arguidos, tendo-se assistido a uma escalada infame de nomes públicos ligados aos mais diversos sectores, desde políticos a diplomatas, jornalistas, economistas; se bem me lembro o processo chegou a ter mais de 300 testemunhas e 30 arguidos, um verdadeiro escândalo. Toda uma rede estrategicamente montada e revelada da forma mais brutal, clientes dos mais variados quadrantes socio-politicos contratam o casal para a realizacao de snuffs (pequenos filmes registando actos de índole sexual e violenta sobre crianças) pagos a peso de outro e distribuídos por toda a Europa. Esta situação levou a sociedade belga a organizar as Manifestacoes Brancas, únicas na história daquele país, nas quais chegaram a participar 200 mil cidadãos, valões, francófonos, germanófilos, envergando t-shirts simplesmente brancas como testemunho de indignação para com o lastimável processo. Dutroux é transferido de estabelecimento prisional, o seu julgamento é adiado sine-die, a justica é fortemente abalada por fugas estratégicas para o estrangeiro, o escândalo atinge altos magistrados da nação, e surpreendentemente, passados cerca de seis anos, apenas Dutroux se encontra encarcerado, tendo-lhe sido possível escapar por duas vezes aos calabouços por conveniências várias que ainda se encontram por explicar. Até a sua esposa teve pena atenuada, sendo-lhe possível efectuar visitas domiciliárias. A sociedade belga, estigmatizada pelas suas próprias divisões internas, nunca recuperou deste hediondo escândalo socio-político.
Em Portugal, lamento encontrar semelhanças no acompanhamento deste processo, muito especialmente pelos órgãos de comunicação social, onde ainda ontem, na RTP1 podemos presenciar, incrédulos, a perseguição, a pé, por parte duma jornalista, ao magistrado do TIC responsável pelo processo, inquirindo-o acerca de alguns pormenores suspostamente relevantes. Fugas de informação successivas desviam as atenções alimentando a autofágica euforia dos tablóides, altos magistrados proferem declarações inacreditáveis, agentes políticos lançam suspeitas sobre as próprias instituições responsáveis... Infelizmente, este tipo de atitude apenas prejudica todos aqueles que sofreram as provações físicas e psicológicas causadas por comportamentos doentios, as vítimas deste processo. Haja respeito por elas, pelo processo, pelas instituições, pelos arguidos, pelas testemunhas, por todos nós. (André Barbosa)
ADENDA: O mesmo dizemos, sem hesitar, da jornalista do PÚBLICO, Alexandra Lucas Coelho, que aliás sempre me pareceu ser sobretudo uma repórter. O que vale para o JM «à direita» vale para a Alexandra «à esquerda». Como vêem, não dizemos mal, por sistema da imprensa tradicional, nem das pessoas «do outro lado», muitas das quais respeitamos. Difícil mesmo é dizermos alguma vez bem do Expresso. PM
JMT: O nosso amigo João Miguel Tavares regressou do Iraque. Os textos que o João Miguel publicou no DN nas últimas duas semanas merecem ser aqui louvados, porque mostram como se pode fazer jornalismo sério, bem pesquisado, bem escrito, ponderado, sem cair na esparrela da «imparcialidade». O JM não escondeu a sua opinião: foi objectivamente bom varrer aquele regime, mesmo com erros e com imensas dificuldades à vista. E o Diário de Bagdad que escreveu misturava, sem falhas, a curiosidade, o humor, a emoção, sempre em notas pertinentes E de português irrepreensível. Pois é, meus amigos, é possível ser «de direita» e ser um profissional sem mácula. Resultado ao fim dos noventa minutos: Tavares 4 Fisk 1. Bem-regressado, João Miguel. PM
NA MINHA RUA: Não tenho, nestas anotações, nenhuma tese (poupem-me a polémicas estéreis). São duas curiosidades, realmente acontecidas:
Na minha rua, alta noite, seguia uma rapariga pouco mais nova que eu, fisicamente encorpada, muito morena, vestida, acho, de azul. Vejo-a passar e, por qualquer razão (vislumbre rápido do rosto?) penso «este mulher está em plena euforia sexual». Quando dobrei a esquina, vi a rapariga parada ao pé da farmácia, a meter moedas numa máquina de preservativos.
Na tabacaria ao cimo da minha rua, entro, de manhã, para comprar os jornais. Folheando revistas está um senhor com cinquenta e muitos anos, pequeno, de barba grisalha curta, casaco cinzento e óculos. Um cidadão vulgaríssimo. Suspeito: «este tipo é um esquerdista encartado». Ao sair, já com os jornais, ouço-o pedir: «era o Monde Diplomatique, se faz favor». PM
Na minha rua, alta noite, seguia uma rapariga pouco mais nova que eu, fisicamente encorpada, muito morena, vestida, acho, de azul. Vejo-a passar e, por qualquer razão (vislumbre rápido do rosto?) penso «este mulher está em plena euforia sexual». Quando dobrei a esquina, vi a rapariga parada ao pé da farmácia, a meter moedas numa máquina de preservativos.
Na tabacaria ao cimo da minha rua, entro, de manhã, para comprar os jornais. Folheando revistas está um senhor com cinquenta e muitos anos, pequeno, de barba grisalha curta, casaco cinzento e óculos. Um cidadão vulgaríssimo. Suspeito: «este tipo é um esquerdista encartado». Ao sair, já com os jornais, ouço-o pedir: «era o Monde Diplomatique, se faz favor». PM
quarta-feira, maio 28, 2003
ALMODOVAR ME MATA: Almodovar... over-rated or what? Típico cineasta que é bem gostar se se é de esquerda or what? É obvio que não se safava se não fosse espanhol or what? Se responderem what a qualquer uma delas deixo de vos ler. (Tyler)
Caro Tyler: se me perguntasse há uns anos diria, sem hesitar: over-rated. As comédias descabeladas tinham a sua graça, mas eram demasiado descabeladas para o meu gosto, demasiado kitsch. Só gostava verdadeiramente de Matador, um filme hiper-pretensios que gostava de rever para reavaliar, mas que na altura me caiu no goto. Almodovar tinha o seu interesse para teses sobre «A Espanha pós-franquista», «A Movida e a Cultura» e assim por diante, mas pouco mais. Comecei a mudar de opinião com Carne Tremula, um filme de uma dureza, de uma economia e de um erotismo sujo admiráveis. Não sou um incondicional de Todo Sobre Mi Madre, muito meladrama kleenex por um lado e muita piada fácil por outro. Mas com Habla con Ella rendi-me. É um filme magnífico, magnificamente escrito e filmado, com uma justeza emocional rara, e torneando com brilhantismo os perigos do «infilmável» (a violação). Politicamente, não creio que Almodovar seja particularmente de esquerda, excepto o antifascismo do costume e a gayzice. Mas é, claramente, um tipo fascinado por Hollywood, por uma Hollywood onde Fassbinder vingasse. É um Todd Haynes com salero, «maricón» onde o outro é «queer», e pícaro onde o outro é cínico. É um Sirk de caracóis. Podia ser pior. PM
Caro Tyler: se me perguntasse há uns anos diria, sem hesitar: over-rated. As comédias descabeladas tinham a sua graça, mas eram demasiado descabeladas para o meu gosto, demasiado kitsch. Só gostava verdadeiramente de Matador, um filme hiper-pretensios que gostava de rever para reavaliar, mas que na altura me caiu no goto. Almodovar tinha o seu interesse para teses sobre «A Espanha pós-franquista», «A Movida e a Cultura» e assim por diante, mas pouco mais. Comecei a mudar de opinião com Carne Tremula, um filme de uma dureza, de uma economia e de um erotismo sujo admiráveis. Não sou um incondicional de Todo Sobre Mi Madre, muito meladrama kleenex por um lado e muita piada fácil por outro. Mas com Habla con Ella rendi-me. É um filme magnífico, magnificamente escrito e filmado, com uma justeza emocional rara, e torneando com brilhantismo os perigos do «infilmável» (a violação). Politicamente, não creio que Almodovar seja particularmente de esquerda, excepto o antifascismo do costume e a gayzice. Mas é, claramente, um tipo fascinado por Hollywood, por uma Hollywood onde Fassbinder vingasse. É um Todd Haynes com salero, «maricón» onde o outro é «queer», e pícaro onde o outro é cínico. É um Sirk de caracóis. Podia ser pior. PM
ISSO, AÍ, OH SIM, CONTINUA: Não costumo gostar do que escreve o Prof. Rosas, muito menos recortar. Mas o seu ARTIGO de hoje parece-me deveres interessante. Rosas, no seu texto, lembra como neste processo da pedofilia temos assistido a um comportamento incrível da... direita (palavra de honra). Aprecio particularmente o segundo parágrafo, que vou citar sic:
A direita açula, desta forma, e fá-lo conscientemente, os instintos mais primários de um sector da opinião pública cansado ou desiludido \uF8E7 e geralmente com razão... \uF8E7 com o poder político e a governação, mas profundamente despolitizado e civicamente apático, facilmente manipulável pela demagogia populista de direita e de extrema-direita contra "a política" e os "políticos" como um todo. Isto é, facilmente disponível para, na enxurrada das frustrações e das revoltas acumuladas, se deixar transformar em tropa de choque contra a própria democracia e as liberdades públicas. Nem vale a pena estar a recorrer aos exemplos históricos para sabermos como este tipo de demagogia pode acabar. Os sinais estão aí. Uma espécie de caceteirismo fascizante que vem espreitando a nossa vida política \uF8E7 veja-se a arruaça de Felgueiras \uF8E7 e que a direita, naquele jeito inaugurado por Paulo Portas de se pôr de fora da "política", parece querer manipular a seu favor abrindo a caixa de Pandora.
O que há aqui de novo não é a ideia de que a direita «açula» os «instintos mais primários» no seu jeito de «caceteirismo fascizante». Isso é o normal, vem no Word do Prof. Rosas e cada artigo tem que ter um parágrafo assim. O que eu acho extraordinário é este \uF8E7 quatro vezes repetido (na edição on-line e em papel). Gralha? É demasiado óbvio como explicação. É possível que se trate de um código: enquanto o Prof. Rosas fala em português para os leitores do PÚBLICO, acrescenta frases herméticas para os bloquistas (do género: «razão tinha o Otelo com aquilo do Campo Pequeno»). Mas eu tenho outra tese. O Prof. Rosas, excitado com a ideia que a extrema-direita tem 50 % dos votos, perde o controlo das teclas, e desliza da sintaxe ainda ortográfica para o frenesi signíco (ena). É um fenómeno conhecido dos que experimentaram alguma vez sexo virtual: começa-se por escrever «o que é que tens vestido?», depois «despe-te», etc etc, e quando se está no «isso, chupa» perde-se, por qualquer razão, o domínio sobre o teclado, e começam a aparecer coisas como »ergspte3rt9oreteo+rpti», «9trg8sr9igusigfsugfiosd» ou mesmo «dfsfffdfkdfkfdçfdçfd纻. O Prof. Rosas, como bom bloquista, é um orgásmico incontido, imaginando sempre moínhos de vento, que assumem sempre a forma de «fascistas». Vai daí, desata a escrever sobre a hidra, baba-se, tem uma erecção, e pronto: «\uF8E7» quatro vezes (uma boa média). E depois desliga o computador e vai dormir. PM
A direita açula, desta forma, e fá-lo conscientemente, os instintos mais primários de um sector da opinião pública cansado ou desiludido \uF8E7 e geralmente com razão... \uF8E7 com o poder político e a governação, mas profundamente despolitizado e civicamente apático, facilmente manipulável pela demagogia populista de direita e de extrema-direita contra "a política" e os "políticos" como um todo. Isto é, facilmente disponível para, na enxurrada das frustrações e das revoltas acumuladas, se deixar transformar em tropa de choque contra a própria democracia e as liberdades públicas. Nem vale a pena estar a recorrer aos exemplos históricos para sabermos como este tipo de demagogia pode acabar. Os sinais estão aí. Uma espécie de caceteirismo fascizante que vem espreitando a nossa vida política \uF8E7 veja-se a arruaça de Felgueiras \uF8E7 e que a direita, naquele jeito inaugurado por Paulo Portas de se pôr de fora da "política", parece querer manipular a seu favor abrindo a caixa de Pandora.
O que há aqui de novo não é a ideia de que a direita «açula» os «instintos mais primários» no seu jeito de «caceteirismo fascizante». Isso é o normal, vem no Word do Prof. Rosas e cada artigo tem que ter um parágrafo assim. O que eu acho extraordinário é este \uF8E7 quatro vezes repetido (na edição on-line e em papel). Gralha? É demasiado óbvio como explicação. É possível que se trate de um código: enquanto o Prof. Rosas fala em português para os leitores do PÚBLICO, acrescenta frases herméticas para os bloquistas (do género: «razão tinha o Otelo com aquilo do Campo Pequeno»). Mas eu tenho outra tese. O Prof. Rosas, excitado com a ideia que a extrema-direita tem 50 % dos votos, perde o controlo das teclas, e desliza da sintaxe ainda ortográfica para o frenesi signíco (ena). É um fenómeno conhecido dos que experimentaram alguma vez sexo virtual: começa-se por escrever «o que é que tens vestido?», depois «despe-te», etc etc, e quando se está no «isso, chupa» perde-se, por qualquer razão, o domínio sobre o teclado, e começam a aparecer coisas como »ergspte3rt9oreteo+rpti», «9trg8sr9igusigfsugfiosd» ou mesmo «dfsfffdfkdfkfdçfdçfd纻. O Prof. Rosas, como bom bloquista, é um orgásmico incontido, imaginando sempre moínhos de vento, que assumem sempre a forma de «fascistas». Vai daí, desata a escrever sobre a hidra, baba-se, tem uma erecção, e pronto: «\uF8E7» quatro vezes (uma boa média). E depois desliga o computador e vai dormir. PM
ELEFANTE BRANCO: Quanto ao vencedor de Cannes, Elephant, espero para ver. Gus van Sant é capaz do melhor (Drugstore Cowboy, To Die For) e do pior (My Own Private Idaho, Gerry), mas cheira-me que este elefante pertence à primeira categoria. A ideia de tratar o tema do massacre no liceu de Columbine sem nexos de causalidade, explicações de pacotilha e demagogias só pode ser um antídoto para o detestável senhor Moore, que entretanto prepara um filme sobre o 11 de Setembro (que talvez se venha a chamar É Bem Feito!). Mas estou muito curioso pelos novos de Lars Von Trier, Gallo e do nosso mui amado Clint Eastwood. Sobre o mais recente filme de Clint, aliás, gostava de assinalar isto: as estrelas são os dois actores mais esquerdistas do panorama americano, Sean Penn e Tim Robbins. Imaginem o Oliver Stone a fazer um filme com o Bruce Willis. Pois. PM
TELEFONEMA PARA TÓQUIO: O Eurico de Barros passou, oficialmente, a Infame honorário, e opina, em exclusivo para a Coluna, sobre o festival de Cannes, de onde acaba de regressar.
Compartilho com os Infames e seus leitores algumas pérolas de Vincent Gallo, autor do individualíssimo, tristíssimo e belíssimo «Brown Bunny» no Festival de Cannes. Sovado até ao osso pela crítica americana no dia a seguir à projecção do filme - que, entre outras qualidades, tem Chloe Sevigny a fazer uma fabulosa chamada para Tóquio a Gallo -, o filme foi defendido pela «crítica de referência» francesa, leia-se «Monde» e «Libé». Ora Vincent Gallo, apesar de ter aspecto «alternativo» e de ser realizador/músico/pintor «maverick», é militante (de carteirinha) do Partido Republicano. Orgulha-se de ter apertado a mão de Richard Nixon, e elogia Ronald Reagan e Charlton Heston a quem o quer ouvir. Quando um crítico de um dos dois jornais acima citados o inquiriu sobre as semelhanças de «The Brown Bunny» com «Easy Rider», Gallo respondeu: «"Easy Rider" é um filme de "hippies" e eu não gosto deles. Gosto mais dos filmes onde os polícias são os bons e os "hippies" os maus». E citou o esquecido mas magnífico «Electra Glide in Blue» (1973), de James William Guercio, onde o herói é um polícia da estrada. Cada vez gosto mais do Vincent Gallo! (O filme foi comprado para Portugal e vai estrear em cinema de certeza).
Eurico de Barros
Compartilho com os Infames e seus leitores algumas pérolas de Vincent Gallo, autor do individualíssimo, tristíssimo e belíssimo «Brown Bunny» no Festival de Cannes. Sovado até ao osso pela crítica americana no dia a seguir à projecção do filme - que, entre outras qualidades, tem Chloe Sevigny a fazer uma fabulosa chamada para Tóquio a Gallo -, o filme foi defendido pela «crítica de referência» francesa, leia-se «Monde» e «Libé». Ora Vincent Gallo, apesar de ter aspecto «alternativo» e de ser realizador/músico/pintor «maverick», é militante (de carteirinha) do Partido Republicano. Orgulha-se de ter apertado a mão de Richard Nixon, e elogia Ronald Reagan e Charlton Heston a quem o quer ouvir. Quando um crítico de um dos dois jornais acima citados o inquiriu sobre as semelhanças de «The Brown Bunny» com «Easy Rider», Gallo respondeu: «"Easy Rider" é um filme de "hippies" e eu não gosto deles. Gosto mais dos filmes onde os polícias são os bons e os "hippies" os maus». E citou o esquecido mas magnífico «Electra Glide in Blue» (1973), de James William Guercio, onde o herói é um polícia da estrada. Cada vez gosto mais do Vincent Gallo! (O filme foi comprado para Portugal e vai estrear em cinema de certeza).
Eurico de Barros
FAIXA DE GAZA: Cinco da tarde, passeio pelos territórios ocupados, vulgo Chiado. Sou de certeza, num espaço de quinhentos metros, o único tipo que prefere a Carrie-Anne Moss ao Keanu Reeves. E ainda dizem que não tenho empatia pelos palestinianos. PM
EXCESSO DE TECNOLOGIA: Passo pelo Rato, primeiro pela Procuradoria e depois pela sede do PS. Não sei como não me tinha apercebido dessa proximidade flagrante. O que me leva à seguinte questão: para quê escutas telefónicas, senhores investigadores? Basta um vulgar copo de água contra a parede. PM
AH PORTUGAL SE FOSSES SÓ QUATRO SÍLABAS: Dezenas de livros novos, dezenas de merdices, quase todos romances atamancados, lamurientos, foleiros. Nem de propósito, encontro F., um dos nomes essenciais da literatura portuguesa actual. Elogio-lhe vivamente a obra. Diz-me que não tem escrito, porque não tem editora. É nestes momentos que eu percebo que esta piolheira é irreformável. PM
E ESPELHOS EM CASA? O PÚBLICO publicou ontem este artigo, chamado «A Política está Cinzenta». O timing não é muito adequado, mas em geral podemos dizer que é verdade: a política portuguesa é cinzenta. Mas quem assina este artigo? O colorido edil Macário Correia. Sabemos que a série continuará com um artigo de Carlos Castro intitulado «Há Imensos Gays por Aí». PM
MUDAM-SE OS TEMPOS: Seis da tarde. No auditório da FNAC do Chiado, passa La Grande Bouffe, de Marco Ferreri. Um filme que causou um enorme escândalo em 1976. Hoje, atrai (à borla) uma dúzia de pessoas, enquanto outras, no café, nem levantam a cabeça, comendo o seu croissant com queijo, indiferentes ao sexo, ao vótimo, à coprofilia. Mudam-se os tempos... PM
TEREI? O Ricardo elogia o meu desabafo a propósito do Lidiagate, comentando que eu «tenho tomates». Lembro-me da primeira vez que ouvi esse comentário: foi há muitos anos, era uma rapariga que falava, e parecia francamente surpreendida com o facto. PM
NEM DEUS É PERFEITO: Quando se começou a falar do livro de «conversas com Deus», não fazia ideia quem era Alexandra Solnado. Hoje, vi a sua vera efígie no jorrnal, anunciando uma sessão de autógrafos. Depois de ver a carinha da Alexandra, já percebo porque Jesus quis falar com ela: para lhe pedir desculpa. PM
terça-feira, maio 27, 2003
ESPAÑA: Uma rapidinha sobre as eleições espanholas. Nenhuma dúvida acerca da vitória política de Aznar: 9 comunidades autónomas, 34 capitais de província, votação em Madrid reforçada, perdas socialistas em Barcelona. Não creio que se possa discutir a vitória do PP, mesmo que, em percentagem de votos, tenha ficado um pouco abaixo dos socialistas. A nota dominante é o equilíbrio entre os dois principais partidos de Espanha e isto quando se temia uma hecatombe do PP depois de Aznar se ter metido até aos joelhos na bonita coligação que invadiu o Iraque há dois meses. A verdade é que se comparamos estes resultados com as últimas e recentes eleições belgas, percebemos que as escolhas feitas na guerra ao Iraque não têm qualquer relevância eleitoral. A Bélgica é um país dividido por 4 grandes partidos e nenhum deles conseguiu sozinho mais de 15% dos votos. Mas o caso belga tem outra explicações e veremos se, com o estado das coisas, o nosso não será parecido. Em Espanha, temos as legislativas aí à frente e nelas se decidirá se o futuro da Europa passa ou não por governos de esquerda. PL
OLHA O INFAME: Eu e o Tiago andámos na escola juntos. Ele desenhava melhor do que eu. Nenhum de nós tinha sorte com mulheres. A nossa amizade esteve uma vez em perigo quando, numa aula de trabalhos manuais, eu concebi um Buda argiloso que ele desancou sem pudor. O Tiago agora escreve coisas destas:
Simplesmente repugna-me fazer do cristianismo aquilo que ele nunca foi. Uma ideologia de convívio social, uma colectânea de arrotos optimistas, um lacaio barbeado do consenso.
A infâmia toca a todos. Um abraço, Tiago. PL
Simplesmente repugna-me fazer do cristianismo aquilo que ele nunca foi. Uma ideologia de convívio social, uma colectânea de arrotos optimistas, um lacaio barbeado do consenso.
A infâmia toca a todos. Um abraço, Tiago. PL
OUTRO MUNDO: Ando pela rua. Calor excessivo, umbigos à solta, nudez sem amor (esta tem dono). Nada me prende a atenção, nada me faz mudar de passeio, acelerar ou moderar o passo. Sou o típico, fiél caminhante walseriano. Quero ver tudo. Não me interessa nada. Mas eis que páro, eis que algo me desperta o interesse. Esta algo é um cartaz promocional do Forum Social Português. Leio: "Um outro mundo é possível". Um outro mundo é possível. Eu também acredito. Lá para os setenta (se não for antes), hei-de pensar seriamente nisso. PL
ESCONDER: A presunção de inocência é um princípio inatacável. É a única coisa certa diante de tanta poeira, tanta coisa mal dita, tanto patoá exagerado. Declarações de absoluta inocência juradas por amigos, merecem-nos todo o respeito mas valem o que valem. Lembrem-se que as pessoas escondem coisas. Que todos escondemos coisas. Coisas que nos desarrumam, que nos embaraçam, que nos comprometem. Não pensem que se pode conhecer absolutamente uma pessoa. Não pode. Revejam o Magnolia. PL
PORTUGAL: Pensem: em Felgueiras, temos o Portugal velho, do cacete e da sapatada; na Moderna, o Portugal novo, da corrupção finória e das influências; na Casa Pia, um Portugal escabroso até hoje inteiramente desconhecido. Não é fácil saber qual deles prevalece ou qual é o mais verdadeiro. A resposta, como diriam uns amigos meus, deve estar na simbiose. PL
SEM INTERMEDIÁRIOS: Hoje, 5 da tarde, edifício do Diário de Notícias, Alexandra Solnado recebe os fregueses para uma sessão de autógrafos. Está prometida conexão directa com o céu, sem intermediários e interferências. Está bem que é preciso comprar o livro mas isso é um pormenor sem importância. Não podemos ter tudo de graça. PL
'DASSE: Ocorre-me investigar um pouco o caso belga ne net, para poder traçar paralelos. Mas depois lembro-me que para isso tenho que pesquisar no Google «pedofilia». Desisto da ideia. Ainda tinha a Judite a levar-me o PC. PM
BLOGWATCH: Por lapso, não demos ontem o devido destaque a este artigo do Diário Económico, assinado por Carlota Mascarenhas. Até agora, tinham sáído alguns bons artigos no PÚBLICO (em vários dos suplementos), um texto apressado e cheio de incorrecções no DN e um texto para esquecer no EXPRESSO. Porque é que o texto do Económico é melhor que os textos do DN e Expresso? Porque a jornalista falou com alguns bloggers, evitando assim escrever disparates e inverdades. Uma pergunta: alguém está a fazer um dossier disto (além de nós)? Qualquer dia, a blogosfera portuguesa já tem um portfolio bem simpático. PM
segunda-feira, maio 26, 2003
MITOLOGIAS: Tínhamos decidido não dar mais tempo de antena à semi-polémica Cheirosas & Letradas. Não era, francamente, um tema muito letrado, e já começava a cheirar mal. No entanto, abrimos aqui uma excepção. Recebemos uma vigorosa carta de uma leitora italiana, que tem um incontornável ascendente sobre um dos Infames e que por isso chegou a ser aqui publicada - oh horror - sem o devido comentário. Vamos então à missiva, devidamente respondida.
Só agora, depois de um período de ausência, volto a ler a vossa Coluna. E constato que, segundo estatísticas correntes, feitas com particular atenção por PM, embora com aprovação de PL e JPC, existe uma incompatibilidade entre beleza e cultura no interior da comunidade intelectual feminina portuguesa. Esse dado, aliás, parece unir as opostas sensibilidades políticas dos vários blogs (indignação fictícia à parte). Só um infame – os meus parabéns! -, com um grande sentido estético, parece ter tido tomates (coisa rara na comunidade intelectual masculina) para dizer aquilo que é opinião comum. A forma como é descrita a comunidade intelectual feminina portuguesa aproxima-se de um Jardim Zoológico onde, entre um café e uma água tónica, deambula um número considerável de estranhas criaturas de leituras cultas e hálitos fedorentos. Parece que já Baudelaire nos tinha feito notar que só a estupidez é um cosmético da beleza. Mas não deixa de ser uma frustração, para os eternos sonhadores, terem sido desflorados pelas emoções vividas através dos grandes clássicos da literatura, sem reflexo no real! Mas onde poderão encontrar as vossas Rafaelas, Catarinas, Bárbaras, Marisas, num lânguido torpor cuja voluptuosa carnalidade beija as vossas razões? Onde se encontra a mulher linda que emana pura luxúria e cuja sensualidade emerge dos seus lábios carnudos? Onde se encontra a mulher livre, ambiciosa, elegante, bela, sedutora, envolta num eloquente erotismo, onde é possível abandonar-se, embriagando-se na sua áurea carnal? Não conheço a comunidade intelectual feminina portuguesa, mas concordo com PM: aí é impossível encontrar tal mulher. Mas digo mais: tenho dúvidas que a possamos encontrar na rua, entre as gentes, ou nos cafés bem frequentados, entre luz e sombras de mamas siliconadas. Talvez uma dessas, a Rafaela, possa ser encontrada num museu, entre as cores de Tâmara de Lempicke (pintora polaca) que a retrata tão bela na sua nudez (considerada pelo Sunday Times como um dos mais belos nús do século XX). E as outras mil mulheres da vossa fantasia? Mulheres assim, queridos Infames, não existem, porque mulheres assim não nascem. Inventam-se - um bocado por escolha, um pouco por necessidade, através das páginas de uma revista, nos flashes de um fotógrafo que as retrata através de mil artifícios, no pincel de um artista ou nas palavras de um escritor. Mas então, perguntam vocês, a beleza não existe? Existe, meus queridos, claro que existe. Mas é uma beleza humana, real – e, como toda a realidade, imperfeita, única e irrepetível. Haverá algo de mais belo do que a sensualidade de uma imperfeição num corpo harmónico? Existirá algo de mais erótico do que uma desarmante simplicidade? Existem apenas mulheres. Mulheres em busca de si próprias, prisioneiras das próprias imagens (belas ou feias que sejam), de ex-loiras a ex-morenas, de ex-vamps a ex-estrelas; mulheres que olham em volta, talvez à procura de um espelho que lhes restitua uma identidade definida; que são uma, nenhuma e cem mil. Mulheres desejosas de aparecer despidas, para desaparecerem e reaparecerem vestidas de si próprias. Mulheres contraditórias: crianças adultas, estúpidas inteligentes, putas santas. Mulheres que olham para si e se envergonham e depois se reconhecem, pois voltam a olhar-se ainda e gostam. Não existe nada de mais lindo do que o olhar sofisticadamente inteligente, porque culto, de uma mulher com sabedoria de si própria que emana a sua personalidade através de uma genuinidade tão autêntica porque desejada. Oh!, a beleza, queridos rapazes, é um instante e muitas vezes foge-nos das mãos. A beleza vem e vai: basta colhê-la mas não levá-la a sério. Lindas ou cultas? Lindas e cultas, eis as mulheres de hoje! E se vocês estão a perguntar se a pessoa que escreve é linda e/ou culta, eu respondo e deixo que sejam vocês a julgar: sinto-me linda quando estou bem, quando me encontro à vontade com as pessoas que amo. E é nesse momento que a pele é perfeita; os cabelos, estupendos; o corpo, ligeiro. Tudo o resto, queridos, è un mare di cazzate. (Maria Bocchichio)
Cara Maria: obrigado pela tua carta, como sempre culta e com um estilo recomendável (e ainda te queixas do teu português). É bonito ver uma compatriota de Dante descer das alturas do Paradiso para o semi-vernáculo polémico de «putas», «tomates» e «mamas siliconadas». É sempre bom ver alguém de uma civilização superior dignar-se a descer ao nosso nível chulo e atascado. Grande parte do que dizes já foi por mim respondido e desmentido: não tenho nenhuma «estatística» (só a minha infeliz experiência pessoal e a dos meus conhecidos); não postulei nenhuma «incompatibilidade entre a beleza e a cultura» (apenas disse que é um fénomeno raro); não creio que essa seja uma «opinião comum» (se fosse, não se percebia a polémica), embora seja mais comum do que as pessoas admitem. O interesse da tua carta começa a partir daqui, na questão importantíssima da «invenção da mulher». Dizes, e bem, que o(s) paradigma(s) da beleza feminina e da própria feminilidade devem muito a elaborações (masculinas) sobre o assunto, e citas as grandes musas dos grandes poetas e pintores. Nisso tens, obviamente, razão. Quase tudo é cultura, e certamente a questões de género e de estética têm forte dimensão cultural. Mas quero anotar duas coisas. A primeira é a desconfiança face, nomeadamente, à «literatura» quando a literatura exprime opiniões politicamente incorrectas. A «literatura» de Baudelaire é, sem dúvida, maravilhosa, mas o que Baudelaire escreve sobre as mulheres, oh não, isso pertence à abominação. Conheço bastante bem esse double standard face à literatura. A segunda é que nenhum dos Infames nega a sua condição de indivíduos submergidos no universo da literatura, com todas as suas glórias e efeitos secundários, entre os quais se conta, com certeza, uma enorme «estetização» e «idealização» da realidade, y compris les femmes. Mas isso não justifica, parece-me, que descaias na sub-literatura feministas segundo o qual a beleza é um «mito». Deixa essas patetices para a Naomi Wolf. A beleza é uma construção? Com certeza, e Baudelaire disse-o melhor que ninguém. É um estatuto? Um valor de troca? Um imaginário? Sem dúvida. Mas todos nós, cara Maria, sabemos (mesmo com as nossas discordâncias subjectivas) o que é o «belo» e o «feio», na arte como na vida. E também nos homens e nas mulheres. A beleza é um dado de facto, mesmo se mutável. A não ser que adoptes uma tese de que tudo são construções e mitologias, sem realidade dentro, e nesse caso o amor é a construção e a mitologia número um da humanidade. Mas eu sei que não queres ir por aí. A «comunidade intelectual feminina portuguesa» é, esteticamente, um horror. É a minha opinião. É a minha experiência. Talvez as mulheres bonitas vejam valorizada socialmente a sua beleza, e sintam que não precisam de queimar pestanas com o Carlos Fuentes, não faço ideia. Mas a verdade é que não têm conta os sustos estéticos que um literato português apanha no seu contacto com o outro sexo. Já admiti, de resto, que o mesmo se passa provavelmente com os homens, a começar por yours truly, mas isso não me preocupa grandamente, como compreenderás. A tua coda feminista é, francamente, uma espécie de filosofia estética «new age» que, desculparás, abomino. Além de que, Maria, tu estás em péssima posição para falares neste tema. E porquê? Porque és italiana. E toda a gente sabe que esteticamente a Itália é o sétimo céu. Em Itália toda a gente é bonita, e mesmo quem não é pelo menos veste-se bem. Em Roma vi lojistas bonitas, passeantes bonitas, adolescentes bonitas, mães de família bonitas, polícias sinaleiras bonitas, condutoras de autocarro bonitas e recepcionistas de hotel bonitas. Para não falar, é claro, das actrizes e das apresentadores de televisão. Conheço mal o meio intelectual italiano, mas acredito que em Itália até as escritoras e intelectuais são mais giras que a Natasha Henstridge. Mas estás na Lusitânia, Maria, e tens que ver as coisas à nossa dimensão. Há mulheres portuguesas bonitas? Há, lindíssimas. Se andares pela noite, são mais que as mães. Mas na Gulbenkian? No Pen Clube? Na APE? Na Ler Devagar? Na Cinemateca? Caríssima Maria, aí vivo eu, e te garanto que aí a estética foi de férias. Deixa-me cá com o meu «mare di cazatte» e com as minhas lamúrias justificadas, que nem todos podemos ser desse optimismo resplandescente. Andar por cá é bastante difícil e escuro. Baudelaire, suponho, concordaria. PM
Só agora, depois de um período de ausência, volto a ler a vossa Coluna. E constato que, segundo estatísticas correntes, feitas com particular atenção por PM, embora com aprovação de PL e JPC, existe uma incompatibilidade entre beleza e cultura no interior da comunidade intelectual feminina portuguesa. Esse dado, aliás, parece unir as opostas sensibilidades políticas dos vários blogs (indignação fictícia à parte). Só um infame – os meus parabéns! -, com um grande sentido estético, parece ter tido tomates (coisa rara na comunidade intelectual masculina) para dizer aquilo que é opinião comum. A forma como é descrita a comunidade intelectual feminina portuguesa aproxima-se de um Jardim Zoológico onde, entre um café e uma água tónica, deambula um número considerável de estranhas criaturas de leituras cultas e hálitos fedorentos. Parece que já Baudelaire nos tinha feito notar que só a estupidez é um cosmético da beleza. Mas não deixa de ser uma frustração, para os eternos sonhadores, terem sido desflorados pelas emoções vividas através dos grandes clássicos da literatura, sem reflexo no real! Mas onde poderão encontrar as vossas Rafaelas, Catarinas, Bárbaras, Marisas, num lânguido torpor cuja voluptuosa carnalidade beija as vossas razões? Onde se encontra a mulher linda que emana pura luxúria e cuja sensualidade emerge dos seus lábios carnudos? Onde se encontra a mulher livre, ambiciosa, elegante, bela, sedutora, envolta num eloquente erotismo, onde é possível abandonar-se, embriagando-se na sua áurea carnal? Não conheço a comunidade intelectual feminina portuguesa, mas concordo com PM: aí é impossível encontrar tal mulher. Mas digo mais: tenho dúvidas que a possamos encontrar na rua, entre as gentes, ou nos cafés bem frequentados, entre luz e sombras de mamas siliconadas. Talvez uma dessas, a Rafaela, possa ser encontrada num museu, entre as cores de Tâmara de Lempicke (pintora polaca) que a retrata tão bela na sua nudez (considerada pelo Sunday Times como um dos mais belos nús do século XX). E as outras mil mulheres da vossa fantasia? Mulheres assim, queridos Infames, não existem, porque mulheres assim não nascem. Inventam-se - um bocado por escolha, um pouco por necessidade, através das páginas de uma revista, nos flashes de um fotógrafo que as retrata através de mil artifícios, no pincel de um artista ou nas palavras de um escritor. Mas então, perguntam vocês, a beleza não existe? Existe, meus queridos, claro que existe. Mas é uma beleza humana, real – e, como toda a realidade, imperfeita, única e irrepetível. Haverá algo de mais belo do que a sensualidade de uma imperfeição num corpo harmónico? Existirá algo de mais erótico do que uma desarmante simplicidade? Existem apenas mulheres. Mulheres em busca de si próprias, prisioneiras das próprias imagens (belas ou feias que sejam), de ex-loiras a ex-morenas, de ex-vamps a ex-estrelas; mulheres que olham em volta, talvez à procura de um espelho que lhes restitua uma identidade definida; que são uma, nenhuma e cem mil. Mulheres desejosas de aparecer despidas, para desaparecerem e reaparecerem vestidas de si próprias. Mulheres contraditórias: crianças adultas, estúpidas inteligentes, putas santas. Mulheres que olham para si e se envergonham e depois se reconhecem, pois voltam a olhar-se ainda e gostam. Não existe nada de mais lindo do que o olhar sofisticadamente inteligente, porque culto, de uma mulher com sabedoria de si própria que emana a sua personalidade através de uma genuinidade tão autêntica porque desejada. Oh!, a beleza, queridos rapazes, é um instante e muitas vezes foge-nos das mãos. A beleza vem e vai: basta colhê-la mas não levá-la a sério. Lindas ou cultas? Lindas e cultas, eis as mulheres de hoje! E se vocês estão a perguntar se a pessoa que escreve é linda e/ou culta, eu respondo e deixo que sejam vocês a julgar: sinto-me linda quando estou bem, quando me encontro à vontade com as pessoas que amo. E é nesse momento que a pele é perfeita; os cabelos, estupendos; o corpo, ligeiro. Tudo o resto, queridos, è un mare di cazzate. (Maria Bocchichio)
Cara Maria: obrigado pela tua carta, como sempre culta e com um estilo recomendável (e ainda te queixas do teu português). É bonito ver uma compatriota de Dante descer das alturas do Paradiso para o semi-vernáculo polémico de «putas», «tomates» e «mamas siliconadas». É sempre bom ver alguém de uma civilização superior dignar-se a descer ao nosso nível chulo e atascado. Grande parte do que dizes já foi por mim respondido e desmentido: não tenho nenhuma «estatística» (só a minha infeliz experiência pessoal e a dos meus conhecidos); não postulei nenhuma «incompatibilidade entre a beleza e a cultura» (apenas disse que é um fénomeno raro); não creio que essa seja uma «opinião comum» (se fosse, não se percebia a polémica), embora seja mais comum do que as pessoas admitem. O interesse da tua carta começa a partir daqui, na questão importantíssima da «invenção da mulher». Dizes, e bem, que o(s) paradigma(s) da beleza feminina e da própria feminilidade devem muito a elaborações (masculinas) sobre o assunto, e citas as grandes musas dos grandes poetas e pintores. Nisso tens, obviamente, razão. Quase tudo é cultura, e certamente a questões de género e de estética têm forte dimensão cultural. Mas quero anotar duas coisas. A primeira é a desconfiança face, nomeadamente, à «literatura» quando a literatura exprime opiniões politicamente incorrectas. A «literatura» de Baudelaire é, sem dúvida, maravilhosa, mas o que Baudelaire escreve sobre as mulheres, oh não, isso pertence à abominação. Conheço bastante bem esse double standard face à literatura. A segunda é que nenhum dos Infames nega a sua condição de indivíduos submergidos no universo da literatura, com todas as suas glórias e efeitos secundários, entre os quais se conta, com certeza, uma enorme «estetização» e «idealização» da realidade, y compris les femmes. Mas isso não justifica, parece-me, que descaias na sub-literatura feministas segundo o qual a beleza é um «mito». Deixa essas patetices para a Naomi Wolf. A beleza é uma construção? Com certeza, e Baudelaire disse-o melhor que ninguém. É um estatuto? Um valor de troca? Um imaginário? Sem dúvida. Mas todos nós, cara Maria, sabemos (mesmo com as nossas discordâncias subjectivas) o que é o «belo» e o «feio», na arte como na vida. E também nos homens e nas mulheres. A beleza é um dado de facto, mesmo se mutável. A não ser que adoptes uma tese de que tudo são construções e mitologias, sem realidade dentro, e nesse caso o amor é a construção e a mitologia número um da humanidade. Mas eu sei que não queres ir por aí. A «comunidade intelectual feminina portuguesa» é, esteticamente, um horror. É a minha opinião. É a minha experiência. Talvez as mulheres bonitas vejam valorizada socialmente a sua beleza, e sintam que não precisam de queimar pestanas com o Carlos Fuentes, não faço ideia. Mas a verdade é que não têm conta os sustos estéticos que um literato português apanha no seu contacto com o outro sexo. Já admiti, de resto, que o mesmo se passa provavelmente com os homens, a começar por yours truly, mas isso não me preocupa grandamente, como compreenderás. A tua coda feminista é, francamente, uma espécie de filosofia estética «new age» que, desculparás, abomino. Além de que, Maria, tu estás em péssima posição para falares neste tema. E porquê? Porque és italiana. E toda a gente sabe que esteticamente a Itália é o sétimo céu. Em Itália toda a gente é bonita, e mesmo quem não é pelo menos veste-se bem. Em Roma vi lojistas bonitas, passeantes bonitas, adolescentes bonitas, mães de família bonitas, polícias sinaleiras bonitas, condutoras de autocarro bonitas e recepcionistas de hotel bonitas. Para não falar, é claro, das actrizes e das apresentadores de televisão. Conheço mal o meio intelectual italiano, mas acredito que em Itália até as escritoras e intelectuais são mais giras que a Natasha Henstridge. Mas estás na Lusitânia, Maria, e tens que ver as coisas à nossa dimensão. Há mulheres portuguesas bonitas? Há, lindíssimas. Se andares pela noite, são mais que as mães. Mas na Gulbenkian? No Pen Clube? Na APE? Na Ler Devagar? Na Cinemateca? Caríssima Maria, aí vivo eu, e te garanto que aí a estética foi de férias. Deixa-me cá com o meu «mare di cazatte» e com as minhas lamúrias justificadas, que nem todos podemos ser desse optimismo resplandescente. Andar por cá é bastante difícil e escuro. Baudelaire, suponho, concordaria. PM
CUSPIR PARA O AR: João Soares é um homem extraordinário, e não me refiro à sua faceta de ficcionista erótico. Como agnóstico e maçon, não se pode dizer que seja filho da mãe, mas como casca grossa não se pode dizer que seja filho do pai. Ontem, o dr. João Soares, iracundo, vomitou no Rato que Portas, Santana e Durão estavam por trás da famosa «cabala». Isto, mesmo que partilhada em privado por alguns socialistas, não era coisa que se dissesse em público, e com maus modos, e seguiram-se vários protestos. Quando, numa reunião do PS, é Ana Gomes a voz da sensatez, é porque as coisas estão de pantanas. O dr. Soares, à saída, negou tais declarações inflamadas, e hoje reiterou o desmentido, numa patética manobra na qual ninguém acredita. Entretanto, o dr. Soares vai ter que ser testemunha no caso Moderna, no qual também tem, pelos vistos, a sua parte de trapalhadas. Ora isto prova que: 1) o caso Moderna não foi varrido pelo caso pedofilia 2) o caso Moderna envolve muita gente, com vários graus de culpabilidade, e de vários quadrantes políticos 3) é perigoso cuspir para o ar. Ainda pensamos pedir aqui, na Coluna Infame, a demissão imediata do dr. Soares dos cargos no PS e do cargo de deputado; mas, que diabo, ele é apenas uma testemunha. Não é casa para tanto barulho. PM
A QUEM O DIZES: O Ricardo descobriu que os editores portugueses não têm sentido de humor. Ó Ricardo, podias ter-me perguntado que eu tinha-te dito isso com abundante conhecimento de causa. Tens o meu número, não tens? Liga-me, rapaz. Os amigos são para as ocasiões. PM
FNAC SERVICE: Hoje fui à FNAC (olha que novidade). E tenho três notas de leitura (não, esta semana não saiu nenhum livro do Chomsky, believe it or not).
1. Adoro polémicas. Só isso justifica que tenha considerado comprar a versão portuguesa do livro do físico João Magueijo. O homem escreve sobre assuntos dos quais nada sei e que, na verdade, me interessam pouco. Mas os ataques, os insultos, as provocações, e um cientista a fazer isto tudo, confesso que me adoça a boca. Acabou por lá ficar, porque já ia aviado, mas ficou o sintoma.
2. Tenho imensa inveja dos Olímpicos. O que são os Olímpicos? São as pessoas que não têm, como eu tenho, a obrigação de ler as novidades quase todas, e se ficam pelos clássicos e pelas obras-primas. Como invejo quem, neste momento, adquire apenas livros de primeira água: a Odisseia traduzida por Frederico Lourenço (Cotovia), o Memorial de Aires de Machado de Assis (Cotovia), o romance de Leonid Typskin sobre Dostoievski (Gótica), os ensaios de Roberto Calasso sobre A Literatura e os Deuses (Gótica), enfim, livros que valem o dinheiro e o tempo. Ao passo que eu tenho que deixar alguns desses livros na mesa de cabeceira, e na mesa de trabalho estão todos os poetas recentes do distrito de Viseu ou outra coisa assim interessantíssima. Como eu vos invejo, ó Olímpicos.
3. Malta esquerdista, corram às livrarias: depois do grosseiro e pateta Livre Noir du Capitalisme, saiu agora o bem mais interessante Le Livre Noir du Colonialisme, editado por Marc Ferro (Laffont). É um calhamaço, mas vale certamente a pena, mesmo que irrite os Infames nalgumas passagens.
Boas leituras. PM
1. Adoro polémicas. Só isso justifica que tenha considerado comprar a versão portuguesa do livro do físico João Magueijo. O homem escreve sobre assuntos dos quais nada sei e que, na verdade, me interessam pouco. Mas os ataques, os insultos, as provocações, e um cientista a fazer isto tudo, confesso que me adoça a boca. Acabou por lá ficar, porque já ia aviado, mas ficou o sintoma.
2. Tenho imensa inveja dos Olímpicos. O que são os Olímpicos? São as pessoas que não têm, como eu tenho, a obrigação de ler as novidades quase todas, e se ficam pelos clássicos e pelas obras-primas. Como invejo quem, neste momento, adquire apenas livros de primeira água: a Odisseia traduzida por Frederico Lourenço (Cotovia), o Memorial de Aires de Machado de Assis (Cotovia), o romance de Leonid Typskin sobre Dostoievski (Gótica), os ensaios de Roberto Calasso sobre A Literatura e os Deuses (Gótica), enfim, livros que valem o dinheiro e o tempo. Ao passo que eu tenho que deixar alguns desses livros na mesa de cabeceira, e na mesa de trabalho estão todos os poetas recentes do distrito de Viseu ou outra coisa assim interessantíssima. Como eu vos invejo, ó Olímpicos.
3. Malta esquerdista, corram às livrarias: depois do grosseiro e pateta Livre Noir du Capitalisme, saiu agora o bem mais interessante Le Livre Noir du Colonialisme, editado por Marc Ferro (Laffont). É um calhamaço, mas vale certamente a pena, mesmo que irrite os Infames nalgumas passagens.
Boas leituras. PM
ME ME ME: Dizem-me: «Fulano de tal não gosta de ti». Eu não conheço Fulano de Tal, mas compreendo-o; que diabo, eu também não gosto de mim, e não se pode censurar aos outros as ideias que nos permitimos a nós mesmos. Mas tenho que dizer que há várias maneiras de não gostar de alguém, e neste caso de mim, e que essas maneiras me merecem reacções diferentes. Vejamos: quando alguém diz que não gosta de mim pessoalmente, só lhe posso oferecer a minha compreensão e solidariedade. Se dizem que não gostam de mim como «poeta», fico preocupado ou não, conforme reconheça ao opinador a capacidade de distinguir um poema de um chinelo felpudo. Se uma pessoa não gosta de mim como «crítico literário» isso significa, segundo a minha experiência, que essa pessoa ou um terceiro seu amigo foi «injustiçada» por um dos meus textos. Mas quando me dizem que não gostam de mim por causa da Coluna Infame, aí sou, realmente, um homem feliz. PM
COITO: Passo os olhos pelo Diabo (não, a Coluna Infame não aprecia e não lê o Diabo) e não consigo perceber como é que o jornal mais reaccionário do pedaço tem um colunista chamado João Coito. PL
UM HOMEM A CAMINHO DO PS : O nosso apreço pelos renovadores cresce todos os dias. Ora vejam este mas escrito por um exemplar da espécie, Edgar Correia, no diário nortenho de hoje: Mas também é necessário que o poder judicial, na sua independência, compreenda a dimensão política das suas iniciativas, para estar em condições de defender os seus procedimentos de quaisquer manobras e interesses exteriores à justiça, seja qual for a sua origem. Não percebo o que isto quer dizer mas a intenção deve ser essa. PL
HUMOR: Interessantes as reflexões do Ricardo sobre o humor. O Ricardo rejeita um humor limitado, um humor de pantufas, cheio de cuidado, o humor portuguesinho do brincar sem ofender, do brincar com tudo menos com coisas sérias. Concordo com ele. Não existem assuntos proibidos ou intocáveis para um humorista. A prova de fogo de um humorista é mesmo essa: ter piada. E isso já tem muitas dificuldades. Limites? Só mesmo a surpresa, a precisão, o talento. O humor atabalhoado, previsível, entaramelado, não é humor. Não existem temas abordáveis e temas inabordáveis. Correcto. Mas o Ricardo não trata de um outro problema: a relação entre o humor e a política. Como deve um humorista relacionar-se com a política? As opções políticas condicionam o tipo de humor que se faz? São irrelevantes? É verdade que existem humoristas apolíticos (penso em Herman José) mas também humoristas mutíssimo politizados. Chaplin, por exemplo, tinha o seu quê. Jon Stewart tem imensa piada e os seus programas são deliberadamente políticos. Moore também, embora o humor seja nele uma forma de desonestidade intelectual particularmente irritante. P.O.Rourke também é político e cá dos meus. Mas digamos, não é mais fácil encontrarmos um humorista de direita do que um humorista de esquerda? Um humorista de esquerda encontra-se em inevitável conflito consigo mesmo. O humor do RAP não é, parece-me, um humor muito político. E aqui entra o meu palpite: de certo modo, o esquerdismo do Ricardo atrapalha-o como humorista. A esquerda é seguramente menos passiva do que a direita. A esquerda é seguramente menos capaz de ironizar consigo mesma do que a direita. A esquerda aspira a uma realidade construída ideologicamente, a uma realidade idealizada. O humor é, convenhamos, a negação de tudo isto: a negação da ideologia, a negação daquela construção e daquela idealização; no limite, até pode ser a negação da realidade e a afirmação do absurdo. Um humorista é uma criatura distanciada do mundo, distanciada da realidade. Nalguns casos, isto só é possível com muita efabulação e algum pícaro (vejam o Dom Quixote ou o Tristam Shandy); noutros ainda não está muito longe da tragédia e da loucura (vejam Mark Twayn). Tudo isto parece-me estar em desacordo com o materialismo esquerdista da praxe. Talvez por isso os comunistas são as criaturas com menos sentido de humor que eu conheço. Esta conversa é para continuar. PL
A PROFUNDIDADE: Nunca consegui ler um até ao fim. Mas tenho todos os livros de Maria Gabriela Llansol. Incluindo este último, O Senhor de Herbais, que a crítica recebeu de pernas abertas. Percebo a crítica. E percebo-me a mim. Não que Maria Gabriela Llansol seja demasiado profunda para os meus pobres neurónios. Mas, neste país, a «profundidade», que usualmente passa pela «ilegibilidade», é marca evidente da alta literatura. Sê «profundo» e serás bom. Não ocorre aos nossos críticos que é fácil descer às «profundidades». Mas verdadeiramente difícil é conseguir emergir do fundo e regressar à tona razoavelmente intacto. Com a pérola nos dedos. Llansol é um peso morto. JPC
THE HORROR, THE HORROR: Isaiah Berlin costumava dizer o Holocausto produzira um único aspecto positivo: o horror do mundo perante os crimes nazis. Até à Segunda Guerra, e mesmo com uma Europa destruida entre 1914-18, resistiu ainda um optimismo progressista que Auschwitz e outras instituições acabaram por liquidar. Depois do Holocausto, os seres humanos perceberam que existem limites - e que, uma vez cruzados esses limites, emerge necessariamente em nós uma espécie de «horror moral», sinal de que estamos vivos e permanecemos, apesar de tudo, humanos. Claro que a Casa Pia não é comparável a nada disto. E claro que a pedofilia não é comparável ao homicídio. Mas, ao contrário do que se apregoa por aí com apocalíptica histeria, os recentes escândalos oferecem um bom sinal: eles demonstram que o país não caiu na anemia ética e sabe ainda reconhecer o vício e a iniquidade. Os escândalos de pedofilia não são a prova de que o país está doente. São precisamente o contrário. A prova de que o país está saudável. JPC
domingo, maio 25, 2003
TERROR: Os atentados da Al Qaeda em Marrocos, na Chechénia, na Arábia Saudita são um sinal de que esta organização terrorista está viva e actuante. Mesmo sem se saber o paradeiro de Bin Laden. A escolha da Arábia Saudita e de Marrocos não se devem apenas ao reforço das medidas de segurança nos Estados Unidos. A seita poderia, sem grandes dificuldades, escolher como alvo um pequeno país europeu. Mas preferiu atacar dois países muçulmanos, o que mostra bem como o totalitarismo islâmico está fundamentalmente interessado em matar. Em matar nos Estados Unidos, na Europa, na Ásia mas também bem perto de casa, no Médio Oriente. Nada disto me espanta. Um dos grandes livros que li este ano foi escrito por um intelectual de esquerda, Paul Berman. O livro chama-se "Terror and Liberalism" e, para além de estar fabulosamente bem escrito, é um retrato do niilismo totalitário de que se alimentam todas as organizações terroristas. Berman, que apoiou a guerra ao Iraque, defende que todo o liberal que se preze tem de combater decididamente o terror totalitário destes movimentos islâmicos. O terrorista típico é, por isso, o Homem Revoltado» de Camus, que, por descrer de tudo, não respeita nada. Saint Just, Stirner, Nietzche, são pensadores ocidentais. E Berman dedica dezenas de páginas a tentar demonstrar o que o carácter totalitário do fundamentalismo islâmico é produto de um certa contaminação ocidental sofrida pelo Islão. Não acompanho todos os argumentos de Berman, na essência argumentos puramente liberais. Mas desde o clássico de Laqueur que não lia um livro tão apaixonante e tão rico sobre a dimensão intelectual e ideológica do terrorismo. Não percam. PL
MINISTRA? Compreendemos o silêncio do Governo mas não o da Ministra da Justiça. As violações do segredo de justiça andam num alegre carrossel e não se ouve um comentário ou uma acção da responsável máxima pela justiça portuguesa. É em momentos de crise que um político tem que demonstrar se conta. PL
JUÍZES: Somos defensores da independência do poder judicial. É uma chatice, bem sei, mas, como respeitamos muito o princípio da separação de poderes, não temos outra escolha. Não achamos que os juízes não devam ser escrutinados mas que há formas mais convenientes para o fazer do que lançá-los para a fogueira da praça pública. Não me repugna a ideia de as magistraturas assumirem, neste processo da Casa Pia, uma «função pedagógica» como recomendava ontem Pedro Magalhães e recomenda hoje António Barreto. É verdade que se criaram já dúvidas sobre a credibilidade da investigação e sobre a legitimidade das decisões tomadas pelo juíz de instrução (por exemplo, o artigo de Daniel Deusdado), o que torna inevitável alguma exposição pública do poder judicial. Mas é preciso ter cautela com esta exposição. Não se pode pretender rotinas de conferências de imprensa, diários do dia na Gomes Freire ou juízes transformados em estrelas televisivas depois da telenovela das nove. Os juízes existem para fazer justiça e ponto final. A justiça não deve ser uma coisa impenetrável e invisível mas não poderá também acabar numa conversa de café entre a dona Fátima e o sr. Alfredo. Caberá ao Procurador-Geral da República assegurar que os esclarecimentos e informações que há a prestar se façam dentro dos limites de um Estado de Direito. Portugal ainda não é a Itália, amigos. Não receitem vacinas se tudo se pode ainda curar com um simples comprimido. PL
POVÃO: Segundo o DN, 61 % dos felgueirenses, voltariam a votar em Fátima Felgueiras. Apesar de a senhora ter fugido para o Brasil, confirmando assim as suas malfeitorias de corrupção. Por isso é que eu costumo dizer que defendo a democracia, mas não me considero exactamente um «democrata». A democracia é indiscutivelmente melhor que os outros regimes, mas a democracia tem momentos como este, em que a vontade da maioria é bruta, besta, boçal. Claro que podemos dizer, como eu digo, que o povo não tem razão. Mas isso não é... democrático. O mundo é complexo. PM
ESCUTAS: Evito trazer discussões jurídicas para esta página. Essas discussões têm mais sentido noutros sítios. E, com franqueza, sempre preferi os «Irmãos Karamazov» ao Código Penal. A vida, é certo, levou-me para uma Faculdade de Direito mas sou o primeiro a pôr de lado o típico e falaz imperialismo das disciplinas jurídicas. Não sou penalista mas, de qualquer forma, deixo um conselho a quem anda por aí a dar opiniões sobre as escutas telefónicas. Leiam o Código de Processo Penal. Leiam todo o capítulo sobre os meios de prova. Não se fiquem só pelos artigos transcritos nos jornais do dia. Leiam que não são só os arguidos que podem ser sujeitos a escutas telefónicas (desde logo, também os defensores). Leiam que as escutas telefónicas podem ser utilizadas para certo tipo de crimes, desde que sejam úteis para a descoberta da verdade material. Leiam que qualquer meio de prova usado contra a privacidade nas telecomunicações fora dos casos previstos na lei, constitui um crime. Leiam que o material recolhido através das escutas é imediatamente destruído se não tiver utilidade para a investigação. É preciso então todo este charivari político? Se o PS tem conhecimento (e, já agora, seria bom que nos esclarecesse sobre as suas fontes) que as escutas ultrapassaram os limites da lei e foram indevidamente empreendidas, então não há outra coisa a fazer que não seja pugnar pela punição disciplinar e criminal dos infractores. E, quanto a Paulo Pedroso, se estão tão certos que as escutas foram ilegais, também saberão que são nulas. Visto assim, tudo parece fácil. Mas o PS preferiu a histeria. PL
SÓ: Fui ontem ao cinema ao Corte Ingles. Uma multidão. E, como sempre, grupos (grandes e pequenos) famílias, amigos, casais de esposos ou namoradas. Na bilheteira longa, no átrio a aborrotar, nas salas movimentadas, era a única pessoa que estava sozinha. Ninguém vai ao cinema sozinho, conheço até quem ache horrível a mera ideia. O medo da solidão é um dos nossos maiores medos. PM
THERE'S NO TURNING BACK: Ferro Rodrigues discursou à nação com outro espírito e outra postura. Agora é que os socialistas vão ser «serenos», «racionais». O que lá vai, lá vai. A indignação, a perplexidade, a suspeita: tudo isto permanece mas Ferro mostrou vontade de seguir em frente e continuar a fazer política como tem feito até aqui. Não contem com ele para «alterações legislativas» cirúrgicas e rápidas. Amanhã, até participará numa discussão sobre a economia nacional. Não sei se conhecem a peça «Os Últimos dias da Humanidade» de Karl Kraus. Na peça, depois do desastre se ter consumado, Kraus põe na boca do imperador estas notáveis palavras: «Nunca quis isto». O ar apaziguador de Ferro Rodrigues lembra-nos o imperador de Karl Kraus. O desastre está aí, pelas mãos sábias das gentes do PS: está lançada a dúvida sobre a legalidade da investigação em curso, sobre as motivações das detenções ordenadas, sobre o substrato material das decisões judiciais neste processo. Um ex-Ministro da Justiça serviu-se de informações recolhidas em violação do segredo de justiça. Um conhecido versejador jurou defender a democracia de um perigo imundo chamado Tribunal de Instrução Criminal. Os socialistas desprezaram a habitual sensatez de Souto de Moura e desconhecem, pelos vistos, a existência do Conselho Superior de Magistratura. Fizeram a sua escolha. Uma escolha grave e irresponsável: acossados, decidiram que a sorte do partido está à frente da justiça do país. Não nos podemos esquecer disto. Ninguém se pode esquecer disto. Estes senhores habitam um mundo que não existe: um mundo de falsos fantasmas, de putativas perseguições políticas conduzidas por magistraturas, de irresponsabilidade na ponderação das instituições. Não lhes ocorreu que a criminalidade que aqui está em causa não é uma criminalidade de poder, como é, diga-se, a corrupção ao nível do Estado; é uma criminalidade de perversão organizada em que todos podem estar envolvidos: políticos, embaixadores, apresentadores de televisão, médicos e outras profissões. Uma criminalidade que a opinião pública não vê como «política», mesmo que possa envolver figuras políticas. Os políticos do PS não souberam fazer essa destrinça e acharam-se, como ainda se acham, vítimas de uma pedregosa manigância política. Contribuíram assim para uma guerra que não existia. Hoje, toda a gente é suspeita: políticos e magistrados, procuradores e juízes, todos são suspeitos de qualquer coisa, sem que se saiba bem o quê. Suspeitos de tudo menos de cumprir escrupulosamente as suas funções. O PS foi o principal obreiro desta suspeição generalizada. Os socialistas abriram sózinhos a caixa de Pandora. Se a quiserem agora fechar, vão ter que pedir ajuda. PL
ATÉ PORQUE: Sendo a pedofilia uma tara e um crime (e provavelmente uma doença), não tem nada a ver com «a esquerda» ou «a direita». Em matérias de carácter, de perversões, de actos moral ou legalmente condenáveis, não reconhecemos essa distinção ideológica. Quem achava que os Ballets Rose eram taradice de «fascistas» bem se lixou. Não caíremos no mesmo erro. A ideologia é simples. A mente humana é complexa. Feliz e infelizmente. PM
JÁ AGORA: A Coluna Infame é um blog conservador, «de direita» se quiserem. Por isso, naturalmente estamos ideologicamente mais próximos dos partidos actualmente no governo do que dos partidos actualmente na oposição. Mas não somos um blog partidário, nem queremos fazer luta partidária com este blog. Isto vale como regra geral, mas vale em particular para o actual momento político. Não esperem por isso que, como alguns leitores querem, façamos deste caso uma luta partidária. Não estamos interessados. PM
ATÉ O FERRO SABE: As palavras de Ferro Rodrigues explicam bem a nossa filosofia neste caso pedofilia. Não sabems que é culpado ou inocente, mas não entramos, como diz Ferro, pela «calúnia infame». Nem de políticos, nem de juízes. Nós não somos a Calúnia Infame, somos a Coluna Infame. PM
AINDA NELSON RODRIGUES: Se eu disser que vou escrever um post sobre Nelson Rodrigues em resposta ao Ricardo, terei certamente dois tipos de respostas negativas; dirão uns, enfadados, que não vale a pena insistir em posts «sobre Nelson Rodrigues», dado o reduzido interesse que o assunto lhes merece; dirão outros, espantados, que é preciso ter lata para escrever um post «em resposta ao Ricardo» depois de o dito Ricardo, no seu post, me ter cilindrado, humilhado, desmentido, sovado, atropelado, estilhaçado, arrasado. Respondo aos primeiros que Nelson Rodrigues é um dos patronos dos Infames, e por isso merece-nos os posts que forem precisos. Respondo aos segundos que o talento retórico nunca resolveu substancialmente as questões; vejam bem como o Ricardo, no seu final salivante de vitória inequívoca me compara ao Ministro da Informação Iraquiano, o que é tão mais engraçado quanto o dito Ministro até disse coisas – sobre a justeza da guerra e sobre a política externa americana – que o Ricardo subscreve, e eu de modo algum. Mas vamos ao sumo da questão.
1) Em vários anos de crítica literária, costumo frequentemente apanhar com a acusação de que «não percebi» um determinado livro (quando não gosto de um livro do qual o acusador gostou); mas até agora nunca ninguém tinha sugerido que eu criticava e referia livros que nem sequer tinha lido, como o Ricardo faz em relação a O Anjo Pornográfico de Ruy Castro. Fica sempre bem dizer que o adversário numa polémica não leu um texto que citou; infelizmente, é um truque, esse sim, digno do Min. da Informação, porque eu conheço bem o livro de Ruy Castro, como adiante direi. O que é curioso é que o Ricardo diz que foi agora ler a biografia escrita por Castro (sempre se ganhou alguma coisa com a polémica); no entanto, o Ricardo tinha declarado antes que não se podia confiar nas informações dessa biografia porque se tratava de uma «hagiografia». Isto é: o Ricardo não tinha lido o livro, mas achava que era uma «hagiografia», apenas porque eu o referia como um bom livro. Mas depois foi ler o volume – que está longe de ser uma hagiografia – e achou que havia nele matéria que lhe interessava. Subitamente, a biografia de R.C. deixou de ser um folheto sem préstimo e passou a ser, como eu antes reclamava, a fonte mais segura sobre a biografia de Nelson Rodrigues.
2) Vamos então ao livro. Cita o Ricardo: A voz de Nelson na campanha da anistia era duplamente incômoda para os militares. Era a voz de um pai com acesso a todo o tipo de mídia – e a de um escritor que nunca escondera seu apoio ao regime.(in Ruy Castro, O Anjo Pornográfico. A vida de Nelson Rodrigues, Companhia das Letras, pág. 408). E pronto. Ou melhor: ponto. Ponto final. Mexia KO. Assunto arrumado. Ponto? Com certeza. Mas ponto parágrafo? Não. Porque, a seguir a esse pontinho, que o Ricardo acha que é a fronteira da verdade, vem o seguinte período: Apoio que, na verdade, sofrera um profundo abalo desde abril de 1972, quando se convencera da existência das torturas. O simples reconhecimento por Nelson Rodrigues de que o regime havia torturado denunciava o excremento que se tentara varrer para debaixo da bandeira,
3) Aqui entram as minhas referências à família política do Ricardo. Golpe baixo? De todo. Ser comunista, e do PCP, é perfeitamente legítimo, não tenho nada contra. Mas o comunismo, e o PCP, têm uma história. Quantos foram os comunistas que aderiram ao estalinismo, até se aperceberem dos seus crimes, e se separaram dele?. Quantos foram os intelectuais que abandonaram os respectivos PC’s depois da Hungria e da Checoslováquia? Até Milan Kundera foi comunista. Mas será que alguém se refere a Kundera como «um tipo que foi comunista»? Claro que não, porque o que é relevante é que se tenha apercebido da natureza do regime e da ideologia, e dela se tenha separado. O mesmo se passa, aliás, do outro lado do barricada. O sr. Schindler era simpatizante nazi. O cônsul Aristides Sousa Mendes era um alto funcionário do «fascismo». Mas é assim que os recordamos? Não, pelo contrário: lembramo-nos deles porque salvaram pessoas. Que foi exactamente o que Nelson fez, começando pelo seu filho, mas continuando noutros opositores, como um diplomata (op. cit., pág. 396), uma artista (pág. 408), uma jornalista (pág. 409), entre outros. «Apoiante da ditadura» escamoteia completamente esta realidade, e daí o meu protesto.
4) Nelson era um anticomunista empedernido, como os Infames são, mas, ao contrário dos Infames, achou que o que se chamava, não sem alguma razão, o «perigo comunista» devia ser contrariado por regimes autoritários. Amigo de militares, sobretudo de Médici, Nelson viu no regime militar um perigo menor do que o comunismo. Mas isso mudou significativamente quando, como se disse, soube da tortura e de outros desmandos. De resto, como opinou o esquerdista Otto Lara Resende, é mais provável que «os militares tivessem aderido ao Nelson» (op. cit, pág. 374), visto que o seu prestígio intelectual lhes dava jeito, porque a intelectualidade lhes era naturalmente hostil.
5) Nelson não foi um adversário da ditadura militar; podemos dizer mesmo que foi seu cúmplice. Mas na sua personalidade e nas suas ideias nada o aproximava da ditadura, a não ser o anticomunismo. Seria Nelson defensor da censura? Como, se a sua obra sempre teve problemas com a censura, com a imprensa, com os moralistas? Seria Nelson promotor de uma moralidade repressiva, como o regime? Pouco provável, sendo o seu teatro um palco de obsessões e taras sexuais, que fizeram com que Marcello Caetano lhe chamasse «o imoralão». Será que Toda Nudez Será Castigada é uma peça representativa da mentalidade totalitária e repressiva? Bem pelo contrário. Leiam, por exemplo, esta entrevista (dica do Rui F. Santos).
6) Nelson era uma figura paradoxal, longe de ser um santo, longe de não cometer erros, políticos e outros. Mas era um estilista admirável, um homem frontal e corajoso, um homem de carácter. Por isso o admiramos e citamos.
7) Em todo o caso, tenho de dar razão ao Ricardo numa coisa. É inaceitável defender regimes ditatoriais, nem que seja pela cumplicidade ou pelo silêncio. Ora tendo o partido em que o RAP milita defendido o bloco soviético, e ainda hoje tendo palavras doces para ditaduras como Cuba e a Coreia, não posso evitar este apelo à coerência por parte do meu interlecutor: ó Ricardo, entrega o cartão. PM
1) Em vários anos de crítica literária, costumo frequentemente apanhar com a acusação de que «não percebi» um determinado livro (quando não gosto de um livro do qual o acusador gostou); mas até agora nunca ninguém tinha sugerido que eu criticava e referia livros que nem sequer tinha lido, como o Ricardo faz em relação a O Anjo Pornográfico de Ruy Castro. Fica sempre bem dizer que o adversário numa polémica não leu um texto que citou; infelizmente, é um truque, esse sim, digno do Min. da Informação, porque eu conheço bem o livro de Ruy Castro, como adiante direi. O que é curioso é que o Ricardo diz que foi agora ler a biografia escrita por Castro (sempre se ganhou alguma coisa com a polémica); no entanto, o Ricardo tinha declarado antes que não se podia confiar nas informações dessa biografia porque se tratava de uma «hagiografia». Isto é: o Ricardo não tinha lido o livro, mas achava que era uma «hagiografia», apenas porque eu o referia como um bom livro. Mas depois foi ler o volume – que está longe de ser uma hagiografia – e achou que havia nele matéria que lhe interessava. Subitamente, a biografia de R.C. deixou de ser um folheto sem préstimo e passou a ser, como eu antes reclamava, a fonte mais segura sobre a biografia de Nelson Rodrigues.
2) Vamos então ao livro. Cita o Ricardo: A voz de Nelson na campanha da anistia era duplamente incômoda para os militares. Era a voz de um pai com acesso a todo o tipo de mídia – e a de um escritor que nunca escondera seu apoio ao regime.(in Ruy Castro, O Anjo Pornográfico. A vida de Nelson Rodrigues, Companhia das Letras, pág. 408). E pronto. Ou melhor: ponto. Ponto final. Mexia KO. Assunto arrumado. Ponto? Com certeza. Mas ponto parágrafo? Não. Porque, a seguir a esse pontinho, que o Ricardo acha que é a fronteira da verdade, vem o seguinte período: Apoio que, na verdade, sofrera um profundo abalo desde abril de 1972, quando se convencera da existência das torturas. O simples reconhecimento por Nelson Rodrigues de que o regime havia torturado denunciava o excremento que se tentara varrer para debaixo da bandeira,
3) Aqui entram as minhas referências à família política do Ricardo. Golpe baixo? De todo. Ser comunista, e do PCP, é perfeitamente legítimo, não tenho nada contra. Mas o comunismo, e o PCP, têm uma história. Quantos foram os comunistas que aderiram ao estalinismo, até se aperceberem dos seus crimes, e se separaram dele?. Quantos foram os intelectuais que abandonaram os respectivos PC’s depois da Hungria e da Checoslováquia? Até Milan Kundera foi comunista. Mas será que alguém se refere a Kundera como «um tipo que foi comunista»? Claro que não, porque o que é relevante é que se tenha apercebido da natureza do regime e da ideologia, e dela se tenha separado. O mesmo se passa, aliás, do outro lado do barricada. O sr. Schindler era simpatizante nazi. O cônsul Aristides Sousa Mendes era um alto funcionário do «fascismo». Mas é assim que os recordamos? Não, pelo contrário: lembramo-nos deles porque salvaram pessoas. Que foi exactamente o que Nelson fez, começando pelo seu filho, mas continuando noutros opositores, como um diplomata (op. cit., pág. 396), uma artista (pág. 408), uma jornalista (pág. 409), entre outros. «Apoiante da ditadura» escamoteia completamente esta realidade, e daí o meu protesto.
4) Nelson era um anticomunista empedernido, como os Infames são, mas, ao contrário dos Infames, achou que o que se chamava, não sem alguma razão, o «perigo comunista» devia ser contrariado por regimes autoritários. Amigo de militares, sobretudo de Médici, Nelson viu no regime militar um perigo menor do que o comunismo. Mas isso mudou significativamente quando, como se disse, soube da tortura e de outros desmandos. De resto, como opinou o esquerdista Otto Lara Resende, é mais provável que «os militares tivessem aderido ao Nelson» (op. cit, pág. 374), visto que o seu prestígio intelectual lhes dava jeito, porque a intelectualidade lhes era naturalmente hostil.
5) Nelson não foi um adversário da ditadura militar; podemos dizer mesmo que foi seu cúmplice. Mas na sua personalidade e nas suas ideias nada o aproximava da ditadura, a não ser o anticomunismo. Seria Nelson defensor da censura? Como, se a sua obra sempre teve problemas com a censura, com a imprensa, com os moralistas? Seria Nelson promotor de uma moralidade repressiva, como o regime? Pouco provável, sendo o seu teatro um palco de obsessões e taras sexuais, que fizeram com que Marcello Caetano lhe chamasse «o imoralão». Será que Toda Nudez Será Castigada é uma peça representativa da mentalidade totalitária e repressiva? Bem pelo contrário. Leiam, por exemplo, esta entrevista (dica do Rui F. Santos).
6) Nelson era uma figura paradoxal, longe de ser um santo, longe de não cometer erros, políticos e outros. Mas era um estilista admirável, um homem frontal e corajoso, um homem de carácter. Por isso o admiramos e citamos.
7) Em todo o caso, tenho de dar razão ao Ricardo numa coisa. É inaceitável defender regimes ditatoriais, nem que seja pela cumplicidade ou pelo silêncio. Ora tendo o partido em que o RAP milita defendido o bloco soviético, e ainda hoje tendo palavras doces para ditaduras como Cuba e a Coreia, não posso evitar este apelo à coerência por parte do meu interlecutor: ó Ricardo, entrega o cartão. PM
MACHADO: Camilo e Eça foram dois génios mas seria erro capital esquecermos Machado de Assis, venerado no Brasil e incompreensivelmente desconhecido entre nós. Bem sei que temos um grande machadiano - Abel Barros Baptista - mas os livros de Machado de Assis não têm a justa atenção do público português letrado. Releio agora «Memorial de Aires», em nova edição da Cotovia. Sei que o gosto pela literatura se adquire um pouco por acaso. Sei que o ensino é useiro em matar leitores à nascença, que os currículos escolares de português são uma vergonha sobre a qual é inútil falar. «Memorial de Aires» pode até nem ser o melhor de Machado de Assis (a doutrina divide-se com frequência a este respeito). Mas é um grande livro da nossa língua e tão bem escrito, tão enxuto, tão constante que, amigos, não há como ele na nossa literatura. É o romance brasileiro sem a tapioca literária e o jargão fazendeiro de escritores posteriores, a começar por Jorge Amado. Uma obra indispensável. PL
ZONA ERÓGENA: Algumas leitoras menos iradas sugerem que eu não me preocupe, porque o cérebro é «a zona mais erógena». Ora bem: é verdade que esse órgão em particular nunca me deixou mal (ou que não posso dizer de outros), mas é apenas um cérebro normalíssimo, que não merece de todo um mausoléu leninista para a posteridade. O cérebro pode ser, com certeza, erógeno, como a cereja no bolo, mas é preciso haver bolo. Uma pessoa inteligente pode ser sexy, mas convém que tenha uma mínima base mais material. Pergunto às leitoras que sugerem que o cérebro é o que mais importa: as meninas iriam para a cama com o Stephen Hawking? Bem me parecia. PM
A VIDA SEXUAL DE PEDRO M: Vou falar-vos de um rapaz. Chamemos-lhe Pedro M. A vida sexual de Pedro M é tema de conferências anuais, teses de mestrado e doutoramento e mesmo de alguns sites. Para conhecer este fenómeno estranho, nada melhor do que conversar com as ex-namoradas de Pedro M: estas pessoas, pelo menos as que dormiram com Pedro M, sofrem de stress pós-traumático, doença amplamente estudada em veteranos do Vietname. Diga-se de passagem que dormir com Pedro M é, por si só, uma parafilia, aliás listada pela OMS; não será tão grave como ter sexo com um guaxinim, mas é mais preocupante que manter relações íntimas com uma picadora Moulinex. Pedro M tem uma incapacidade sexual bizarra: em vez de erecções, tem versos de Holderlin, evita o cunnilingus para dissertar sobre Pavese, e no momento do acto relembra, comovido, passos da vida de Kierkegaard. As moças não esquecem o momento, e acordam, anos depois, alagadas e suor e em terror. É uma história bizarra e assustadora, mas não queria deixar de a partilhar com as nossas leitoras que pensam que Pedro M pretende fazer uma OPV de si mesmo. No way. Nem a DECO deixava. PM
OPV: Acoplado ao tema Musas, vieram uma série de outras reclamações, estas dirigidas a mim pessoalmente. Muitas delas referiam o tema Cheirosa & Letradas, no qual não vou por agora insistir. Mas outras sugeriam que eu tinha muito azar com as mulheres que conhecia, o que é verdade, e que estava a usar a Coluna para o engate, o que é mentira. Vejam bem: nós queremos apenas o melhor para as nossas leitoras; acham mesmo que impingiríamos damaged goods às nobres moçoilas que seguem avidamente a nossa página? Jamais me passaria pela cabeça lançar uma OPV de mim próprio via net, e sobretudo através da magna Coluna. Pensam algumas leitoras que eu uso o velho método da lamúria, brilhantemente analisado por Eric Rohmer no seu Conto de Verão: queixar-me da falta de sucesso com as mulheres como método para ter sucesso com as mulheres. Seria bem visto, mas não se passa nada disso, minhas amigas. Não desejo aqui o Mexia a nenhuma das queridas leitoras da Coluna. Uma leitora da Coluna gosta dos seus orgasmos em múltiplos de três, aprecia uma sessão de sexo oral do tamanho de um discurso médio de Fidel, e tem um fraquinho por moços com um six-pack e outras durezas. Ora eu não tenho física, técnica nem tusa para sequer cumprir os serviços mínimos. Conversem comigo sobre romances russos, façam-me festinhas no cabelo, mandem-me mails com animações, queixem-se dos vossos namorados, e pouco mais. Sexo, para mim, é uma coisa que se faz na Internet. Estejam descansadas, leitoras: estão a salvo. PM
MUSAS: Temos recebido alguns mails e telefonemas, piadas, posts noutros blogs e comentários sobre um tema obsessivo: as Musas. Como grande parte dessas queixas e ditoches comete erros grosseiros, passo a explicar:
a) uma Musa - uma Musa da Coluna Infame - é isso mesmo, uma fonte longínqua de inspiração para todos nós e os nossos leitores, e de modo algum alguém a quem seja solicitado o comércio carnal com um dos Infames
b) a Musa deve ser, preferencialmente, uma figura pública, para que os nosso leitores a conheçam
c) a Musa deve ser maior de idade (hello PJ), inteligente, culta e lindíssima
d) a Musa não nos deve ligar nenhuma (vem nos livros)
e) a Musa não tem de ser de direita (as duas anteriores não eram)
f) a Musa não se candidata, nós é que a escolhemos, depois de ponderada deliberação
Esperando ter esclarecido o assunto, continuamos à espera de sugestões. PM
a) uma Musa - uma Musa da Coluna Infame - é isso mesmo, uma fonte longínqua de inspiração para todos nós e os nossos leitores, e de modo algum alguém a quem seja solicitado o comércio carnal com um dos Infames
b) a Musa deve ser, preferencialmente, uma figura pública, para que os nosso leitores a conheçam
c) a Musa deve ser maior de idade (hello PJ), inteligente, culta e lindíssima
d) a Musa não nos deve ligar nenhuma (vem nos livros)
e) a Musa não tem de ser de direita (as duas anteriores não eram)
f) a Musa não se candidata, nós é que a escolhemos, depois de ponderada deliberação
Esperando ter esclarecido o assunto, continuamos à espera de sugestões. PM