terça-feira, junho 10, 2003

A Coluna Infame termina aqui a sua jornada. Começámos em Outubro de 2002, fascinados pelo fenómeno blogger, e convencidos de que era útil travar deste modo novo o combate cultural contra a hegemonia intelectual da esquerda. Desde essa data, o número de blogs mais que duplicou, e muitos deles defendem os mesmos valores que nós. Facto inédito, a «não-esquerda» domina mesmo a blogosfera portuguesa. Paralelamente, cresceu o interesse dos media por este fenómeno. Para além de uma pequena legião de talentos anónimos, cultos e inteligentes, os blogs começaram também a atrair figuras públicas. A blogosfera (política em particular) passou a ser um assunto de conversa. Estamos reconhecidos a todos os que se referiram à Coluna como um blog de referência, e, evidentemente, aos muitos que nos leram e escreveram. Despedimo-nos com um registo de cerca de 80.000 pageviews, o que era para nós impensável há apenas nove meses. Por aqui passaram também as artes e as letras, as observações quotidianas, os fascínios e embirrações. E, claro, uma boa dose de polémica. Esta última foi, porém, longe demais, e não nos eximimos das nossas culpas nessa matéria. Depois dos acontecimentos recentes que levaram à cisão conhecida, entenderam os dois outros autores ser inviável prosseguir, tendo em conta os conflitos gerados, a acrimónia, e o próprio feedback negativo que recebemos. Obrigado a todos os que fizeram, de um modo ou de outro, esta Coluna, incluindo os nossos adversários (mas não inimigos). Globalmente, saímos com a noção de que fizemos o nosso melhor, mesmo com os erros inevitavelmente cometidos. Não faltam, felizmente, blogs de qualidade. Naveguem e descubram-nos. Nós continuaremos atentos à blogosfera.

A Coluna Infame

segunda-feira, junho 09, 2003

ÁGUA NA FERVURA: Amigos, nestes dias desagradáveis embora não necessariamente traumáticos, quero agradecer em meu nome e em nome da Coluna os mails de apoio e incentivo que temos recebido no nosso correio. A Coluna Infame está suspensa, conforme o Pedro Mexia já avisou. Vamos pensar agora no futuro, com lucidez, cabeça fria e sem complexos. As hipóteses estão todas em aberto. Vamos ponderar. Não escondo que o que se passou abriu uma ferida. Mas a epopeia acabou e, pelo menos da minha parte, a vontade de continuar é grande. E outra coisa: a lealdade e a integridade, meus amigos, vêem-se em coisas mais importantes do que os blogs. Não dramatizem e não julguem em demasia. Não estou a dizer que tudo foi exemplarmente feito. Não foi. (Assim se vive e assim se cresce). Mas sejamos razoáveis e clarividentes com tudo o que se passou. Mudemos de página. Entretanto, leiam o meupipi para desopilar. Eu vou aproveitar para saber o que se tem passado no Fórum Social Português. Até já. PL
CAROS AMIGOS: A política não é a coisa mais importante do mundo. Nem os blogs. Ao contrário do que escrevi no meu último post, e devido a dados novos, a minha participação na Coluna está suspensa. E a própria manutenção da Coluna será repensada nos próximos dias. Assim que houver decisões, os nossos leitores serão informados. Há outros (excelentes) blogs para ler: vão por exemplo aos links dos Marretas e escolham. Obrigado. PM

domingo, junho 08, 2003

FIM-DE-CONVERSA: Foi um fim-de-semana aziago para a Coluna Infame e, para encerramento de conversa, para sairmos desta queda, tenho umas notas soltas que quero deixar aqui:

1. Sobre o João Pereira Coutinho. Perder o João é uma grande tristeza para a Coluna Infame. Vamos sentir muito a falta dele. O João é um amigo, um cronista de grande talento, com uma capacidade de escrita avassaladora, um magnífico estilista que muito admiro. Sem ele, a Coluna fica seguramente mais pobre. Podemos pensar que as coisas podiam ter sido de outra forma porque as coisas podem ser sempre de outra forma. Se o Daniel não tivesse feito aquela provocação barata, se o João não tivesse perdido a cabeça, se eu e o PM não tivéssemos reagido, precipitando a saída dele...Mas não adianta pensar nisso agora. Todos fizémos o que achámos que deveríamos fazer. Temos de seguir em frente. A hora é para continuar, não para remoer doentiamente em chão mais do que pisado. Vamos continuar. Mesmo que mais pequenos e mais solitários.

2. Sobre a amizade. Não discuto e, muito menos, desfaço amizades em meios públicos ou semi-públicos como este. Não é o meu estilo. Acredito que as coisas mais importantes das nossas vidas pedem vergonha, recato, timidez. Ontem, registámos com tristeza que a Coluna Infame teve mais de 800 visitas e quase 1200 page views. Quanto mais popular se torna a blogosfera, mais idiotas inúteis atrai. Sabendo que este blog estava em chamas, uma horda de pirómanos resolveu vir cá pela primeira vez para ver o fogo. Sobre a amizade que tenho com o JPC, não direi uma palavra neste blog. Já falámos, como duas pessoas no meio das quais se intrometeu um comboio em marcha. Quero apenas dizer que até uma coisa tão bela como a amizade nos obriga, por vezes, a posições desconfortáveis. Para citar uma coisa que o João escreveu recentemente: «amigos sinceros são inimigos sinceros». É essa sinceridade que faz da amizade uma experiência pura e virtuosa. Tudo o que eu penso sobre esta assunto está num livro do Andrew Sullivan «Love Undetectable» cuja leitura aproveito para recomendar.

3. Sobre o Daniel Oliveira. Conheço o Daniel há pouco tempo. Tivémos algumas conversas. O Daniel encontra-se numa área ideológica que não é a minha e exibe, com frequência, alguns dos piores tiques intelectuais dessa área. Mas há exemplares bem mais primários no grémio bloquista a que o Daniel pertence. Eu fui também visado no post do Daniel que provocou toda esta polémica. Disse o Daniel que eu «gosto de conviver». Digo-vos que esta piada sem jeito e sem sucesso me passou ao lado. Nem sei se era um insulto. Porque a verdade é um pouco essa: escrevo nos blogs, neste blog, para me divertir. Se o jornalismo já me parece uma corrida de 100 metros ao pé do fundismo exigente dos livros, que pessoalmente, mais aprecio, os blogs são apenas uma brincadeira. Não exageremos a sua importância. Não coçemos tanto a borbulha.

4. Sobre a extrema-direita. Na esquerda onde o Daniel passeia politicamente, é muito comum colocar um adversário na extrema-direita. Sim, as palavras têm peso, têm significado. Mas pergunto-me se há ali mesmo palavras? Quando bloquistas e comunistas usam a palavra 'fascismo', 'extrema-direita', não estão a usar palavras. Na boca de toda esta gente, como no poema de Sophia, estes vocábulos transformam-se em «cuspo». Vejam: tinha 15 anos quando alguém me disse que eu era de «extrema-direita». Lembro-me bem: o Baptista Bastos visitou o meu liceu e eu ataquei-o injustamente, infantilmente. Ganhei uma fama de «reaccionário», «de fascista», direitista extremo. Fui ver quem eram os autores da boataria. Percebi que eram carroçeiros e criaturas com mentalidade totalitária. Não liguei muito. Tem sido assim.

5. Sobre a Coluna Infame. Como já disse, a Coluna vai continuar. Sem o estilo inconfundível do João. Continuará comigo e com o Pedro Mexia. Continuará com quem quiser associar-se a este blog de ideias e polémica. João, um abraço. Aos nossos leitores, adiante. PL
NOTA PESSOAL: Não é segredo para ninguém que a Coluna está a atravessar uma crise, a primeira em nove meses de existência. Uma crise séria, que gerou imensas e divergentes reacções noutros blogs e em mails. Este é evidentemente um momento triste para nós. Mas a verdade é que cada um dos três participantes da Coluna escreveu o que achou por bem, assumindo as consequências dos respectivos posts, e não altera o que escreveu. Somos todos adultos, e os adultos responsabilizam-se pelos seus actos. A crispação na blogosfera (na qual eu não sou, como é óbvio, inocente) traz em si mesma a semente da sua destruição. Lamento sinceramente a saída do JPC deste blog, embora no post anterior o João tenha sugerido a criação do seu próprio blog, o que sempre é um consolo para os nossos leitores que muito justamente o apreciam. E sobre este caso, nada mais. Peço que entendam: não vamos responder a todos os mails e blogs que põem o caso em termos de psicodrama pessoal. A divergência foi editorial, e pela minha parte não passa disso. Outras questões são do plano estritamente pessoal. E as amizades não se discutem em público. A Coluna prossegue dentro de momentos. Obrigado. PM

sábado, junho 07, 2003

A COLUNA VERTEBRAL: Em virtude dos últimos acontecimentos na Coluna Infame, manda a dignidade que me despeça dos leitores com duas notas adicionais. Estas notas foram antecipadamente comunicadas a Pedro Mexia, como, aliás, acontece habitualmente entre pessoas civilizadas. Em primeiro lugar, agradeço a Pedro Lomba e a Pedro Mexia o generoso convite que me formularam para escrever neste espaço. Aceitei por um motivo simples: sempre olhei para Lomba e Mexia como dois amigos dignos e leais. Pela mesma razão, é a dignidade e a lealdade que me levam a deixar a Coluna Infame. Em segundo lugar, e em relação à polémica com o sr. Daniel Oliveira, convém notar, para que não reste qualquer dúvida, que não retiro uma única palavra ao meu post de ontem. Nem. Uma. Palavra. Para quem passa grande parte do tempo a estudar e a escrever sobre o fenómeno dos totalitarismos, o epíteto de «extrema-direita» ganha contornos particularmente ofensivos. As palavras são importantes. E quando perdemos o respeito pelas palavras, perdemos tudo. Só mais uma coisa: em breve, haverá novidades minhas neste mundo virtual. Grandes novidades. Espero que os restantes blogs, na altura devida, possam passar a palavra. Quanto ao resto, vemo-nos no Indy de sempre.

João Pereira Coutinho

sexta-feira, junho 06, 2003

OK, CD: Dia 9 há um acontecimento importante. Importantíssimo. Não, não é o Paulinho a depôr em Monsanto. É o novo disco dos Radiohead. Nome do álbum? Informações adicionais? Não perceberam o que eu disse: é o novo álbum dos Radiohead. Não é preciso saber mais nada. Fim-de-semana, passa depressa. PM
CONGRATULATIONS, ANDY: O editor-em-chefe do New York Times, Howell Raines, demitiu-se. É uma excelente notícia, depois de uma série de trapalhadas, reportagens falsas, favorecimentos raciais e campanhas pessoais. Mesmo com Raines, o NYT conseguiu-se manter-se como o melhor jornal do mundo - e é de borla on-line, ó senhores do Expresso - e sem Raines será, esperamos, melhor ainda. Esquerdista (eles dizem «liberal») como sempre, mas um pouco menos faccioso e autoritário internamente. Parabéns ao nosso mestre Andrew Sullivan, que desde o seu despedimento por razões políticas tinha feito de Raines a sua bête noire. O caso pode ser seguido, com links, no magnífico blog de Mr. S. PM
PEQUENA MUDANÇA: Freitas do Amaral vai ser condecorado no 10 de Junho. Primeiro ainda se pensou na Ordem da Liberdade,que premiaria o conhecido passado antifascista do Professor; mas acabaram por decidir pendurar-lhe em vez disso a Ordem de Santiago da Espada. O que acho mal: como defensor do pacifismo, o Prof. do Amaral preferia com certeza receber a Ordem de Santiago Sem Espada. Façam lá o jeito. PM
LUCKY BASTARD: Costumo dizer que não odeio ninguém. Mas é mentira. Uma mentira vil. Eu odeio Ethan Hawke. E porque odeio eu o menino dos Poetas Mortos? Porque: é um actor de cinema célebre, é um romancista bem-sucedido, é bem parecido, é casado com a Uma Thurman e tem filhos dela. Alguém que atropele esse gajo. PM
A CESARE O QUE É DE CESARE: Até eu tenho momentos nos quais acredito no ser humano, ou nalguns seres humanos. Vejam isto: o PL escreveu um post curto sobre Pavese (que é também um dos meus santos de altar e velinha) e tivemos de imediato dois mails sobre o assunto, de duas leitoras de Pavese. Foi bonito. (Ok, agora vou regressar ao pessimismo do costume. A começar......agora). PM
OS ÉTICOS: Estive esta tarde na Feira do Livro. Logo à chegada, num dos primeiros pavilhões, dou de caras com dois Jornalistas Éticos. O que são, perguntam os leitores, Jornalistas Éticos? Ora bem: são aqueles que consideram que existem determinadas ideias políticas («éticas») inerentes à profissão, sem as quais nenhum jornalista o é verdadeiramente. Lembram-me sempre, estes Jornalistas Éticos, os soldados no PREC a jurar bandeira e a jurar também a defesa do socialismo, como se a segunda não fosse uma absoluta excrescência face aos deveres em causa. Também para estes soldados da desfortuna, saudosistas do PREC e de outras glórias, ser jornalista é ser de esquerda, e quem não é de esquerda é um ogre indigno do ofício. Os artigos e outras obras dos Jornalistas Éticos fornecem abudantes exemplos dessa conduta. Ora a Ética pressupõe, julgo eu, uma conduta decente com os outros seres humanos. E não é que eu presencio esta cena edificante: um dos Jornalistas Éticos queria um livro de Proust (o que acho óptimo embora mal-empregado); a menina do pavilhão não sabia se o tinha, ou onde o tinha. Provavelmente, não percebe muito daquilo, o que é o pão-nosso nessas circunstâncias. Mas eis que o Jornalista Ético desata aos berros com a rapariga, numa falta de chá imensa, levando toda a gente próxima a observar o sujeirto de alto a baixo. Ao lado, o Jornalista Ético # 2 aprovava os decibéis. O Jornalista Ético #1 desata então a gritar à menina que ela não sabe é quem é Proust, e não quer dizer. Horrorizada com tal acusação, que se encontra entre a pedofilia e o uso de armas químicas, a moça fica corada, indignada, tenta responder ao Ético que a esmaga com a sua presumível ignorância do senhor Marcel. Enojado, não vi a cena até ao fim, e subi Parque acima, na canícula. Estes tipos são muito Éticos, mas em abstracções de manifesto, não no modo concreto como tratam com as pessoas reais. São jornalistas, mas têm modos de carroceiros. Carreceiros que lêem Proust, bem entendido. PM
A PROPÓSITO DE POLÉMICAS: Já correm textos inspirados e desinspirados sobre o relato que a Papoila fez sobre o «É a Cultura, Estúpido» de quarta feira. O post em causa não é uma maravilha de humor nem de prosa portuguesa, mas não justifica a crispação nem as promessas mútuas de chapadas que por aí correm. A bloguista resolveu fazer uma descrição da sessão focando as características físicas dos participantes, que a moça acha deploráveis, com excepção do Ricardo (eu bem te disse que casaste cedo demais, Ricky). Há alguns comentários realmente desagradáveis, mas cada um tem o seu estilo. Eu nem sou muito mal tratado: a Papolia descreve-me como «gordinho» e «anafado» (uma evidência empírica) e associa-me ao universo do Ásterix e a orgias (duas associações de ideias bem simpáticas). Anunciamos assim que em Setembro, no regresso do É a Cultura, o tema será bem mais sério: O Estatuto do Narrador Heterodiegético no Romance Finlandês Contemporâneo. Os actuais convidados vão fora, assim como o JMT, o ZMS, o NCS e eu. Tentaremos manter a Anabela. O Ricardo está garantido. E os comentadores residentes serão Isabel Figueira, Paulo Pires, Pedro Lima e Inês Castel-Branco. O bilhete será, obviamente, pago. Obrigado. PM
Preferíamos, como compreenderão, não ter que escrever este post, mas ele torna-se por várias razões inevitável.

Os blogs são um fenómeno fascinante, com inúmeros pontos de interesse, e com grandes virtualidades. Trazem também consigo, como tudo, alguns perigos. Um dos maiores perigos é a imediata concretização em texto de uma ideia, de uma frase, de uma emoção. Isso é em si mesmo gerador de perplexidades e disparates, mas ainda se agrava quando se trata de responder a polémicas, quase em tempo real, quase como se tratasse de uma discussão de viva voz. É normal que os bloguistas mais opinativos e turbulentos, como é manifestamente o nosso caso, escrevam por vezes textos ou frases de que se arrependeram posteriormente, mas como se sabe a etiqueta própria dos blogs é contrária (e com razão) ao apagar de posts. Assim como todos nós, particularmente em discussões, temos frases infelizes, o mesmo se passa aqui.

Os três responsáveis por esta Coluna têm as mesmas ideias políticas, mas nem sempre estão de acordo em tudo. Somos três pessoas, aliás de personalidades bem diferentes, e alguns são os pontos de divergência entre nós. Mas a regra tem sido a de sermos solidários mesmo com os posts com os quais não concordamos (e houve uns tantos). Mas desta vez a decência exige que nos distanciemos do post que o João Pereira Coutinho aqui escreveu hoje sobre o Daniel Oliveira.

Somos amigos do João, mas também conhecemos e estimamos o Daniel, e consideramos que a «provocação» do Daniel a que o João respondeu era isso mesmo, uma provocação, igual às várias que todos os dias lemos noutros blogs. Aliás, raro é o dia em que não nos chamam fascistas, em posts, comentários ou mails. Sabendo que isso para grande parte da esquerda inclui toda a direita, não ligamos muito, ou raramente. E o post do Daniel no Blog de Esquerda era até algo inócuo nessa matéria, sendo por isso desproporcional a resposta do João. Um blog de polémicas, como este em parte é, convida ao sangue-frio, à capacidade de encaixe, à ironia e à auto-ironia. Quebrámos duas ou três vezes essa regra, e em todos os casos a nossa violência verbal não foi causada pela discussão de ideias mas por comportamentos das pessoas visadas, fora dos blogs. O nosso registo mais comum, como sabe quem nos tem visitado desde Outubro de 2002, é a ironia e o humor, sem põr de lado a vivacidade argumentativa.

O ideal seria apagar o posts do João, mas isso, como dissemos, não se deve fazer, quer porque vários pessoas já o leram quer porque é desonestidade intelectual. Tentámos falar com o João, e ainda não conseguimos. Mas queremos, desde já, lamentar o sucedido, e pedir ao Daniel Oliveira desculpa pela nossa parte. O facto de termos laços mais fortes de amizade com o João do que com o Daniel (que conhecemos há menos tempo e de quem discordamos em quase tudo), não impede o nosso entendimento de que o post do Daniel não tinha mal nenhum e o post do João cometeu excessos de linguagem e outros.

Pela nossa parte, continuaremos a polemizar ideias e concepções do mundo, mas não entraremos na perigosa espiral de agressão e linguagem que nós próprios já experimentámos.

Para citar uma frase que está muito em voga, apelamos à serenidade de todos, mesmo dos nossos amigos mais próximos.

Pedro Lomba

Pedro Mexia
MAIS FÓRUM: Entretanto, mais nomes para o Fórum Real Português:

- o colunista do Diabo João Coito (que estará sozinho para falar sobre as disfunções sexuais dos retornados do Ultramar);

- o PSD/Madeira;

- A associação dos proprietários de Lisboa (ah, os nossos haveres);

- Os amigos de Olivença (for sure);

- os Bigodes de Viseu, uma meritória associação que defende uma tradição tão esquecida e vilipendiada como o bigode.

E as sugestões continuam. Não esqueçam que este mundo é possível. Deus é grande. PL



FEIRA: Se passarem pela feira do livro hoje ou este fim-de-semana, comprem estes dois livrinhos de contos (são tão baratos que é uma vergonha não o fazerem): "Primeiro Amor e outras mágoas" de Harold Brodkey e "Noites de Festa" de Cesare Pavese. No máximo, gastam 5 euros e têm leitura para a semana toda. Lindos livros. Garantido. PL
UM ESCLARECIMENTO AO SR. DANIEL OLIVEIRA: O sr. Daniel Oliveira, que eu tenho o desprazer de conhecer, resolveu publicar um post no Blog de Esquerda onde me enfia caridosamente na extrema-direita. Não vou, obviamente, comentar o facto: o sr. Daniel Oliveira é radicalmente analfabeto e julga que todos aqueles que não partilham o seu mau-carácter estão necessariamente à direita dele e do atoleiro ideológico onde ele vive e sobrevive. Um atoleiro que, convém esclarecer, o sr. Daniel não gosta de alardear em público - e recordo, a própósito deste facto, a forma trémula como a criatura, na primeira sessão do afamado «É a Cultura, Estúpido!», me implorou para não fazer qualquer referência à sua embaraçosa militância no Bloco de Esquerda, esse belo grupelho cuja constituição heterogénea o Daniel manifestamente despreza. Respeitei o pedido porque acreditei que lidava com um cavalheiro leal. Puro engano. O cavalheiro não é leal e a sua manifesta personalidade de verme impede qualquer discurso civilizado. A partir de hoje, as minhas conversas com o sr. Daniel Oliveira terminaram. E agradeço que a organização do «É a Cultura, Estúpido!» tenha a caridade de enxotar a criatura da minha presença. Caso contrário, boa noite e até à próxima. JPC
FACTOS E DATAS: (Caros amigos: o post seguinte é de certo modo interno, e por isso não interessará à esmagadora maioria dos leitores, mas como eu fui publicamente acusado de mentir, aqui ficam as provas que mostram precisamente o contrário).

No dia 28 de Maio enviámos um mail aos membros da UBL exprimindo a nossa opinião segundo a qual um blog novo, do qual nos tinham falado, não devia entrar na dita UBL, como certos confrades sugeriram. Uma hipotética entrada desse blog era por nós veementemente contestada, por considerarmos que o blog representava uma direita na qual não apenas não nos revíamos mas que francamente repudíavamos. Esse blog era o Pela Santa Liberdade, do Prof. José Adelino Maltez, ao qual não nos referimos nunca antes dessa data. No dia seguinte, 29 de Maio, qual não é o nosso espanto quando lemos este post no dito blog:

Nunca gostei muito de pidismo pretensamente antipidesco nem de insinuações inquisitoriais de “jet set”, feitas de fascismo pretensamente antifascista. Por isso, sempre detestei certa direita sem ideias, que, por seguir a cartilha do marialva, continua a ser a mais estúpida do mundo. Coitados, dos que apenas sabem fazer ataques pessoais, trocando o nome das fichas da “formiga branca”, da PIDE e do COPCON! Até julgam que têm direito de insultar os pobres paizinhos dos pretensos plebeus “feios, porcos e sujos” que, segundo eles, apenas têm a obrigação de bater palmas aos filhos da gente fina que, de vez em quando, vão às feiras visitar o povo, com a mesma chapeleta com que fazem caça nas coutadas dos primos da linha de Cascais.

E num post que se lhe seguia:

Compreendo a fúria deste neopidismo, bem ultraconservador no seu infra-estrutural inquisitorialismo. Muitos sentem-se agora coactos pelos incêndios que geraram, procurando assumir-se como aqueles bombeiros pirómanos da anedota real.

Não havendo qualquer referência nos blogs que justificasse estes posts, e correspondendo eles a uma resposta bastante clara ao conteúdo do nosso mail, reagimos violentamente a estes posts na madrugada do dia 30 de Maio. E reagimos assim porque os posts se referiam a um facto - a nossa oposição à entrada do Pela Santa Liberdade na UBL - que não tínhamos feito público, e que constava apenas do referido mail, que não foi nem tinha que ser enviado ao Pela Santa Liberdade.

Como se vê, os posts de dia 29 de Maio do Prof. Adelino Maltez não respondiam a nenhuma referência pública que lhe tivesse sido feita (não havia nenhuma), mas apenas ao mail, que lhe não era dirigido, e do qual deve ter tido de algum modo conhecimento. Por isso escrevi que a nossa reacção se deveu a essa indignidade. O Prof. Maltez diz que eu menti; mas como se comprova pelas datas, quem mente é o Prof. Maltez, e com todos os dentes. Tínhamos referido jocosa e criticamente a Nova Democracia, mas nunca em público havíamos falado no Prof. Maltez e no seu blog. Quando, na madrugada de 29 para 30 de Maio, descobrimos os posts citados, verificámos que o Prof. Maltez se referia em público - enviesadamente, como é seu hábito - a frases escritas em correspondência privada dirigida terceiros. Não podíamos por isso deixar passar em claro essa manifestação de falta de verticalidade.

O Prof. Maltez, aliás, tem dedicado quase todos os posts desde essa data à Coluna, visto que nós somos realmente o grande perigo para a direita, e não a esquerda cada vez mais refém de um radicalismo bloquista. Por isso, e para que fique claro, aqui reiteramos:

- não apenas discordamos, mas detestamos a direita a que o Prof. Maltez pertence
- não tínhamos nada de pessoal contra o Prof. Maltez, mesmo discordando das suas ideias, até ele se referir em público a uma carta privada, não nos nomeando (como é seu timbre) mas atacando ideias que não tínhamos exposto em público, e não deixando dúvidas que era a nós que se dirigia (como perceberam vários amigos que perguntaram porque polemizava o Prof. Maltez connosco).

A partir daí juntamos ao nosso desprezo pela Moca de Fafe e pela Nova Democracia o nosso repúdio pelo comportamento do Prof. Maltez.

E são estes senhores que querem moralizar a política portuguesa. Tenham vergonha. PM
MAIS SUGESTÕES: Jamais a Associção Portuguesa dos Amigos da Sesta poderá ficar fora do Fórum Real Português, como símbolo que é dessa nobre e tão conservadora virtude, a Preguiça. E ainda por cima estes dorminhocos foram alvo de boicote pela ala BE do Fórum Social Português, que neles vê a vil globalização que nos invade e oprime, desde logo a a partir de Espanha. Para eles, a sesta é como a Zara. Devemos é ser rápidos no convite, porque também já me chegou aos ouvidos que o Carvalho da Silva anda em pulgas para os arregimentar e fazer da sesta mais um direito inalienável dos trabalhadores. (Francisco Mendes da Silva)
ESTE MUNDO É POSSÍVEL: O Miguel Noronha manda mais alguns contributos para o Fórum Real Português:

Milicias Populares de Francelos (lembram-se? o Monteiro até fez uma almoçarada com eles quando ainda era do PP)

Clube de Amigos do jornal "O Dia"

Corpo Docente do ISCSP

Professor Soares Martinez (este é só por si uma instituição)

Movimento 10 de Junho

No Name Boys (associação ordeira de adeptos de futebol).

Aceitamos mais contributos. A Maioria Silenciosa não pode deixar o FSP à solta. Mandem mais colectividades, vá. Não se privem. PM

VUVU FOI-SE EMBORA: Vai e Vem, de João César Monteiro, é um filme póstumo, marcado inevitavelmente pela morte do seu autor, não apenas como facto superveniente mas sobretudo como realidade já inscrita no filme. É uma obra terminal, narrativamente menos elaborada, e no fundo uma variação derradeira sobre uma personagem perigosamente biográfica e exposta. O esquema é conhecido: JCM vampiriza jovenzinhas trigueiras e apeticíveis, sempre entre o lirismo intensamente sexual e o sexo quase liricamente casto. Deste vez chama-se João Vuvu, é «primo» de João de Deus, e um viúvo relativamente alegre, embora com fumos de rotina e melancolia. Tal como JD, diz tudo de forma pausada e bem pronunciada, anda de uma forma desengonçada e aos saltinhos, tem gestos largos para palavras vagas. É um passivo que não é agressivo, apenas um espectador final do mundo. Vuvu procura uma «mulher-a-dias», mas na verdade procura sobretudo uma Galateia. Sai-lhe uma vermelhusca à moda antiga. Vuvu anuncia-lhe logo: «pago mal para despertar a consciência revolucionária». E cita-lhe poemas. Pergunta a moça: «são do camarada Saramago?». E Vuvu: «não, são do cavalheiro Camões». Está estabelecido o tom. Depois, vêm os rituais conhecidos, e aí coser uma meia pode redundar numa perturbadora cena digna de Bataille, e uma donzela pictoricamente reclinada pode fazer pedidos escatológicos. Por momentos dá-se a inversão social, passando Vuvu a criado e a rapariga a mestre. Grande part do filme encena Vuvu no seu vai e vem, percorrendo Lisboa de autocarro. São passeios instrutivos, como aquele que passa por um café, onde em contraluz Vuvu disserta sobre a mentira cristã, e que termina nas escadas do Parlamento, onde Vuvu ensina a uma puta velha a arte de bem chupar um deputado. O sentimento anti-política de JCM vem uma vez mais ao de cima, mas é particularmente impressionante a presciência das suas diatribes contra o funcionamento da justiça, bem como um genial romance anti-Balsemão acompanhado a realejo e executado perante uma jovem mulher-polícia (juro). JCM é um mestre do erotismo, um Jarman hetero e menos kitsch em minuciosas composições, em rigorosos planos e gestos. Uma cena, no Príncipe Real (o locus amaenus deste filme), apresenta Vuvu obcecado com uma ninfeta, cena fabulosa e corajosa que o levaria de imediato ao DIAP, estivesse JCM ainda sob a alçada desta precária justiça. É pena que a segunda parte do filme tenha uma evidente quebra de ritmo. Há pistas que o filme não explora adequadamente: por exemplo, a relação de Vuvu com o filho (Miguel Borges), que acusa o pai de ser no fundo um reaccionário, apostado em fazer de tudo arte (um momento auto-reflexivo determinante). Há também as habituais bizarrias, neste caso assumindo a forma de uma divertida zarzuela com todos os matadouros, de uma sodomização com um pénis tribal (trust me), de uns sonhos mal gizados, e de uma cena de velório totalmente irrelevante. E há umas paranóias políticas, que ligam, bizarramente, piadas anti-semitas e um facho urbano iracundo. Politicamente, JCM sempre foi um anarquista, isto é, um inconsequente. Mas isso são detalhes. Como sempre, o filme é uma festa da linguagem, com frases longas e elaboradas, mas também expressões populares portuguesas de boa-cepa, ditados, asneirada, e achados como este (dito a uma Miss Piscina que tentou a sua sorte em Paris): «o que é bom na Freguesia das Mercês é bom nos Champs-Elisées». As piscadelas cinéfilas são evidentes: Pickpocket de Bresson ou Minelli de Some Came Running (obras-primas absolutas, portanto). Ou ainda, perante a incompreensão de uma moça (a magnífica Rita Durão) à referência cinéfila «Rosebud», a tradução, prosaica e brejeira: «botão de rosa». César Monteiro faz da colagem de citações um poema contínuo, mas é também um poema uma lista de compras numa farmácia, aí já a bordejar o absurdo, mas em todo o caso sublinhando a coexistência no autor de um cinema de imagens com um cinema de palavras. E é com uma imagem que terminamos: um longo plano fixo do olho azul de JCM, como se todo o trabalho voyeurista sobre o seu corpo, ao longo de vinte anos, se concluísse sobre uma essência cristalina, um espelho enganador, âmago do âmago, alma se quiserem, ou apenas um cosmos parado, como a galáxia de A Comédia de Deus. É assim, em sábia e sabida despedida, que JCM se revela num imenso pudor que sempre foi, aliás, gémeo do seu exibicionismo infrequentável e cabotino. Desde o primeiro plano, Vai e Vem é um filme que se demora na contemplação dos seus objectos, na duração, na não-acção, na fisicalidade de um mundo que parece sempre insatisfatória, quase desolada, reduzida a pequenos prazeres. Por isso não é de estranhar que a última obra de César Monteiro acabe num still frame que é ao mesmo tempo o máximo da materialidade e o máximo da metafísica, metáfora de todo um cinema que não me parece arriscado classificar como uns dos raríssimos lampejos de génio do cinema português. PM
SERVE THE SERVANTS: Anteontem, no DIAP, depois de quatro horas de interrogatório, Ferro Rodrigues não conseguiu que João Guerra lhe respondesse satisfatoriamente. Guerra será em breve convocado por Ferro para uma nova sessão. PM

quinta-feira, junho 05, 2003

E JÁ AGORA: Leio um blogger que não é monteirista mas está com o monteirismo, que não polemiza connosco mas passa a vida a mandar-nos indirectas, que não é da "direita que está" mas da direita que-foi, que deve ser, que nunca-será, que nos etiqueta de «direitíssima instalada», «epifenómenos», «bem-pensantes», «politicamente correctos», «burgueses», «situacionistas». Não sei como responder a tanta salganhada. Será Santa Liberdade ou santa ignorância? PL
A GENEROSIDADE: Sobre a generosidade como propriedade da esquerda, o PM já disse tudo o que há a dizer. Eu só queria acrescentar isto. Acreditem nas utopias, nas abstracções, nas ideias que quiserem. Sejam cândidos, sonhadores, irrealistas, absurdos. Pensem no outro mundo, se este não vos contenta. Acreditem na Humanidade (com H grande) e não no vosso quarteirão. Mas, por amor de Deus, não digam que a esquerda é a ideologia das boas pessoas. Desculpem-me mas isso é uma clamorosa idiotice. PL
FORUM REAL PORTUGUÊS: Atenção: a Coluna Infame quer criar o Forum Real Português para combater a hegemonia e o dinamismo revelados pelo Forum que federa as esquerdas. Temos já as Mães de Bragança e os taxistas de Lisboa com direito de inerência no nosso Forum direitista. Pedem-se mais sugestões e propostas de candidatos para colunainfame@hotmail.com. Gratzié. PL
DIREITOS (2): Ontem ou não sei quando, escrevi aqui uma coisa sobre os direitos processuais que a esquerda anda agora a descobrir. E disse que esses direitos eram mais importantes do que os direitos dos animais, das plantas e das mulheres. Houve protestos, pele de galinha, enjoos mas ninguém fez uma contestação de fundo ao que escrevi. E porquê, meus amigos? Porque o que escrevi é absolutamente verdade. O discurso esquerdista da moda tem inflacionado os direitos fundamentais, descobrindo verdadeiras inutilidades constitucionais e jurídicas. Os direitos dos animais e das plantas são uma bagatela cultural ao pé do direito à liberdade. Sim, os direitos das mulheres são compreensíveis e justos mas a ideia de um discurso feminista de direitos inteiramente separado da pessoa humana, é um absurdo teórico. E há muitos outros exemplos. Olhem para as organizações que povoam o Forum Social português e vejam quem é que perdeu a noção do essencial. PL

A CONVENÇÃO: Atenção, eu não aprovarei nenhuma Constituição Europeia que não tenha no preâmbulo o nome de Novalis e do seu ensaio sobre Europa e a cristandade. Temos que honrar as nossas raízes. PL
ORA, ORA: Abro o meu mail pessoal e verifico que tenho uma mensagem de uma desconhecida chamada Ana Kuzmanovic. Não sei quem é esta petiza e, a bem dizer, a mensagem nem é para mim mas para uma tal Sara, criatura que igualmente desconheço. A Ana dirige-se à Sara, lembra-lhe os tempos que passaram juntos, agradece-lhe a linda carta que a Sara lhe mandou e combina por fim, um encontro em Lisboa. Ora, eu não sou parvo e o teor da mensagem, o assunto, sobretudo um ficheiro suspeito anexado ao mail, põem-me imediatamente de sobreaviso. Mensagens de duas lésbicas ainda tolero; agora vírus informáticos, não estou para isso. PL
INSULTOS: Vejo que me excedi um pouco na linguagem e fiz mal. Insultar um larápio que nos rouba as posses é um pleonasmo absurdo. É óbvio que um larápio é um larápio e muitos outros nomes que nem interessa agora desenvolver. Reparem: o insulto mais bem elaborado, mais bem feito só pode ser o insulto mentiroso. Quando chamamos «corno» a um homem prodigiosamente fiel, estamos a honrar a língua, a honrar a humanidade. Quando chamamos «filho de um real cabrão» (atenção: nunca usem isto sem me consultar) a um pai de família, a um ser de rara e embaraçosa integridade, estamos a acrescentar alguma coisa mundo. Estes são os únicos insultos toleráveis e úteis. PL
LÁ ESTÁ, UMA HISTÓRIA PESSOAL: Estamos em época de violações (não apenas à Constituição) e, pela quarta vez num espaço de um ano, o meu modestíssimo VW polo foi violado por um grupo de vândalos. Bem, a culpa é minha. Habituei os larápios a distracções históricas, como deixar as chaves na ignição durante a noite ou esquecer-me da mala de trabalho no banco de trás. Tenho o que mereço. Eles sabem-na toda (linda expressão). Mas gostava agora, 400 contos depois, de deixar um aviso a esta malta que se diverte em entrar no meu boguinhas. Até lhes dou uns nomes fictícios como Franquelim, Carlos Jorge e Mané, três nomes que eu adoptaria imediatamente se por acaso tivesse abraçado a carreira de vadio. O que quero dizer é isto: a partir de hoje, rapazes, a brincadeira acabou. Tenho a viatura altamente aparelhada e armadilhada. Não pensem que me vou esquecer de mais alguma coisa valiosa lá dentro. A não ser queiram muito o livro «Economia Mundial» do Mário Murteira porque, sim, tenho isto no carro e ainda não sei o que fazer a ele. Mas, amigos, para além disso, não haverá mais nada. Fixem o conselho: há pra’ aí direitistas mais instalados do que eu que poderão roubar com mais proveito. Passem bem, meus sacanas. PL

BLOGS: Sim, acho que correu bem o «É a Cultura, estúpido» de ontem. Os residentes estiveram em grande estilo e a conversa sobre os blogs foi melhorando. Vê-se que os blogs são um tema que interessa a muita gente, que esta rapaziada discreta, quietinha na assistência, adora coçar a borbulha e falar disto com esgazeada adoração. Esta ideia de coçar a borbulha com a conversa sobre blogs causa-me algumas tremuras. Digo-vos que no dia em houver casamentos inter-bloguistas, deixo definitivamente de escrever aqui. Isto não é escutismo, meus amigos. Se querem conhecer raparigas, comecem a ir à Igreja todos os domingos. Mas eu percebo e partilho a histeria sobre os blogs. Quando estou em certos sítios e com certas companhias, os blogs são mesmo o único tema de conversa, para irritação e tédio de quem está de fora (o poema do Nuno Costa Santos apanhava isso muito bem). Há um certo lado narcisista nos blogs que é um pouco fruto dos tempos. E não falo do descaramento ou da falta de vergonha em expormos a nossa vida pessoal porque tudo deve ser permitido, desde que tenhamos algum sentido do ridículo. Mas é, sobretudo, a enorme, invencível necessidade de afirmarmos o nosso eu, de não escondermos nada da nossa vida, de escancararmos todos os nossos armários para deleite do vizinho e de sermos até um bocadinho fiteiros com o que nos vai acontecendo todos os dias. Os blogs têm esse lado eminentemente artificial que nos faz falar das cuecas que deixamos no bidé com se isso se tratasse de um acontecimento público. Vamos lá ver: as cuecas borradas que deixamos ao pé da sanita não são um acontecimento público. Mas nós gostamos do assunto e queremos a todo o custo torná-lo público. E o que é espantoso, no fim de contas, é que há quem esteja interessada em ouvir-nos falar disso. Sejamos claros: nisto e em muitas outras coisas, os blogs são apenas uma parte do voyeurismo universal que por aí pulula. PL

DE CERTEZINHA: Dão-se alvíssaras a quem descobrir o blog de José Magalhães. Não é possível que ele não tenha um. PM
PRIDE: Se querem uma daquelas frases rotundas sobre «a diferença entre a esquerda e a direita», direi que conheço imensa gente que tem «orgulho em ser de esquerda», e nunca ouvi ninguém a dizer que tem «orgulho em ser de direita». O que significa que, em termos ideológicos, a direita tem mais vergonha na cara. PM
PERGUNTA ERRADA: Perguntam-me regularmente: «mas não abdicaste da tua vida para manter o blog?». Mas quem é que vos disse que eu tenho uma vida? PM
CAROS ALUNOS DO PROF. PEDRO LOMBA: Sim, este post é para vosselências. Párem de azucrinar o pobre moço com mails anónimos e crípticos. Sim, o vosso Profe é um Infame. Sim, ele é irónico ou zangado, vai ao futebol e a concertos dos Radiohead, lê Norman Mailer, tem pensamentos impuros sobre anatomia e bebe Cubas Livres. Lá por ser docente, recatado e conservador, o Pedro é uma pessoa comásoutras, vê tv por desfastio e diz «foda-se» quando o pisam no metro. E querem saber uma novidade? Os outros professores também. Do outro lado da sala, em cima do estrado, estão tipos iguazinhos a vocês, e vocês têm muita sorte em ter um mestre aplicado e acessível como o Pedro, que não só é perfeitamente civilizado e competente como não vos tenta levar para a cama, ó meninas gostosas, como fazem tantos profs. Por isso, estejam lá quietos com os mailzinhos adolescentes e decorem mas é o funcionamento do TC e rebolem os corpos discentes uns nos outros, que o nosso Pedro tem que dar o nó e escrever uns belos ensaios de que a malta conservadora urgentemente precisa. Ficamos assim? PM
AINDA O MEU CENTERFOLD: Caro Pedro Mexia, é a gratidão que me move neste email. Finalmente pude comprar a revista Maxmen sem a reprovação da minha namorada. Escusei ouvir os típicos “O quê, eu não te chego” justificados apenas pela capa da referida publicação. Tudo isto lhe devo, amigo PM. Basta abrir a página 56 e explicar que era aquilo que eu procurava ao adquirir a revista, a entrevista ao aclamado Pedro Mexia que leio com absoluta regularidade na Coluna Infame. A foto evidencia que não se trata minimamente de uma “Pin-up” (sem desfavor), o assunto Maxmen fica encerrado e a insinuante Mónica Bellucci da capa acaba por se perder na memória (da minha namorada). Ao fim ao cabo nem estava a mentir, tinha mesmo todo o interesse em ler a dita entrevista ao guru de todos os jovens bloguistas conservadores portugueses. Confesso é que houve páginas onde a minha visão inspeccionou com mais lascív...pormenor. Contudo, observo as paredes do meu quarto e vejo-as tão vazias que fico com dúvidas quanto à ideia do amigo Pedro não poder ser nenhuma pin-up.(Samuel Úria)

Caro Samuel: Deus lhe pague. No próximo mês sou entrevistado pela revista Nude Asian Teens. Vá explicando à sua namorada. PM
JAMES, APETECE-ME ALGO: Ainda o James: Um aparte. Eu concordo com o Gato Fedorento e uma pessoa com a tua graça seinfeldiana só pode ser de esquerda. Trust your feelings Luke, come back from the dark side. (James Kirkby)

Caro James: a graça é de esquerda? Só para me ficar pelos blogs, há bloguistas divertidíssimos de direita e de esquerda e nem de direita nem de esquerda, e há trombudos também de todos os quadrantes. A «graça» não nos vem das ideias, mas da personalidade. E faço uma precisão: eu tenho sentido de humor, não tenho assim muita graça. E mais isto: já me viste, sabes bem que eu não sou o Seinfeld; sou definitivamente o George. PM
PP: Como é que depois de teres escrito o post CRP és capaz de criticar o Carvalho da Silva? O anúncio da coligação PSD/PP assustou-me quase tanto como a coligação Áustriaca. Basta ouvires os discursos do PP do TC e o que eles escrevem para tirar todas as dúvidas em relação à ideologia que defendem. Todos os meios de acção, todas as promessas eleitorais, todos os discursos apontam para o mesmo sentido. Só não vê quem não quer. (James Kirkby)

A família Kirkby é uma simpatia (não ironizo). São uns bifes impecáveis, com bons modos e gravata a condizer, mas dá-lhes para a esquerdalhada. Ninguém é perfeito. Quanto ao PP, não creio francamente que sejam de extrema-direita, como disse o Carvalho da Silva. Repara que eu conheço bastante bem a extrema-direita, e poucas pessoas dessa área são do PP (os que eram desfiliaram-se recentemente). Acredita que há mais gente extremista no PSD do que no PP, até pelo perfil salazarista do Cavaco e por causa de o PSD ser um partido de poder, ao contrário do PP, que só o é de vez em quando. Há no PP uns tantos tipos da direita desbocada, como Rosado Fernandes, e existem vários cinzentões e gente irrelevante, mas só raramente detecto afirmações destas. O PP não tem nada a ver com o partido do senhor Haider, sejamos sérios, que é um partido filo-nazi. O PP é composto por conservadores, um ou outro democrata-cristão e um ou outro liberal. Residualmente existe gente mais extremada, mas confesso que as pessoas que até hoje ouvi dizerem coisas como «pretos para África» ou «morte aos maricas» são todas da área do PSD e da ND, e um ou outro nem votam. O populismo, um dos problemas sérios do PP, não é necessariamente de extrema-direita, cada partido tem o seu populismo, para o seu eleitorado. É sobretudo uma forma pouco exigente de fazer política, e lamento sempre que isso acontece, e escreverei todos os posts que sejam necessários a denunciar essa tendência. Agora o que existe é uma tendência da esquerda para considerar «extremistas» certos assuntos, como os da imigração ou da segurança; quem os traga á baila é sempre um perigoso fascistóide. E isso não aceito. A imigração e a segurança (por exemplo) são temas determinantes, e é preciso que sejam discutidos e resolvidos precisamente para evitar tentações extremistas. Não se pode é criar temas tabu. Não há temas extremistas, apenas respostas extremistas. E não tenho visto muitas respostas extremistas da parte do PP, mas sobretudo tiros no pé e navegação à vista. A criação de um partido à direita do PP pode aliás contribuir para evitar qualquer radicalismo do partido, que talvez caminhe, aliás, para uma fusão com o PSD, formando uma tendência claramente à direita num partido com pendor centrista. Os partidos do centro direita e da direita são para nós instrumentos para defender as ideias nas quais convictamente acreditamos. Mas não temos espírito de seita, e daí não contes com os Infames para fazer política partidária. PM
INGRATOS: Marisa Cruz declarou que se tornou conhecida por causa do seu corpo. O que é, conhvenhamos, injusto. Quem, senão Marisa Cruz, divulgou entre nós a Escola de Frankfurt, quem traduziu Robert Calasso senão Marisa Cruz, quem mais do que Marisa Cruz teorizou sobre o hipertexto e a identidade performativa, quem a não ser Marisa Cruz notou a incompatibilidade entre o pessimismo radical e o budismo em Schoppenhauer? Este país é muito ingrato, Marisa. PM
GENEALOGIA DA MORAL: O ZMS, encantado com gentilezas ao domicílio e outras razões que a razão conhece, teve um lapso que eu não esperava: desatou a teorizar sobre a diferença entre esquerda e direita em termos pessoais: de generosidade, solidariedade, simpatia, decência. Não creio que o ZM acredite realmente nesta versão recauchutada da «superioridade moral» (até porque, segundo o Manel, os marxistas não reconhecem a existência da moral). A direita e a esquerda são ideologias, ou conjuntos de ideologias, que valem como ideias, e como ideias apenas se podem analisar. Não há qualquer ligação entre as ideias que a pessoa tem e as suas virtudes, qualidades, a sua personalidade, as suas taras ou simpatias. Se aceitarmos, for argument's sake, que ser de esquerda é o positivo, temos ainda assim que há gente de esquerda que bate na mulher, inferniza os colegas de emprego, dá traques no metro e balda-se aos impostos, e que portanto não representa, na sua vida, um papel positivo, ou sequer decente. Idem aspas para a direita. Nunca fiz diferença pessoal entre pessoas de esquerda e de direita, e quanto mais pessoas conheço mais verifico que a qualidade humana não se divide de todo desse modo. As pessoas são isso mesmo, pessoas, complexas e contraditórias, e irredutíveis às suas convicções políticas. O ZM tem assim razão em dizer que a direita tem uma visão negativa da natureza humana, mas razão nenhuma em supôr que todas as pessoas de direita «desprezam» (cito) seja quem for. Nem que sejam maus amigos, maus vizinhos, maus colegas, o que quiserem. A direita acredita nas pessoas, mas uma a uma, e não nas massas nem em abstracções colectivas. Temos amigos, mas não somos amigos da Humanidade. That's all. PM
CARTÃO VERMELHO: O agora retirado Paulinho Santos é um incompreendido, um injustiçado. Nunca ninguém percebeu que ele foi pioneiro na aplicação das técnicas de protesto anti-globalização nos relvados de futebol. Ainda havemos de ler exegeses do prof. Porventura e «fundos» do prof. Rosas Vermelhas sobre a contribuição vanguardista de Paulinho Santos para a prática da sarrafada contestatária no contexto do futebol multinacional, capitalista e massificante. Paulinho, um mundo novo é possível também à canelada!

Eurico de Barros
REGRESSAMOS EM SETEMBRO: Correu muito bem, if I may say so myself, a última sessão pré-estival do «É a Cultura». Conheci o Diogo Belford Henriques, o Nuno Mota Pinto e os convidados Marta Almeida e Tiago Cavaco, para além da Margarida («Vírgula»), que entrou por inerência para o meu inner circle. Como o tema abordado foi o dos blogs, fica aqui um pedido: juntem os vossos posts passados e futuros sobre blogs e a blogosfera e mandem-nos, por mail, para colunainfame@hotmail.com, para os juntarmos num novo blog, só dedicado a contributos sobre este novo fenómeno. PM

quarta-feira, junho 04, 2003

FICÇÕES: No último domingo, enquanto garatujava um textículo para uma publicação da terra, fiquei a ver na televisão as celebrações portuenses da vitória no campeonato. Os portuenses são uma gente de princípios e estavam aos magotes na avenida dos Aliados a gritar "Filhos da puta SLB", "Rui Rio corno do caralho", "Pinto da Costa é o nosso presidente" e outros mimos. Como era domingo e o Porto estava em triunfo, um grupo de comerciantes aproveitou a festividade para estender a mercadoria na estrada a ver se ganhava algum. Mas a jogada não lhes saiu bem porque a polícia municipal passou pelo quarteirão e as multas começaram a pingar. O mais extraordinário foi a cobertura jornalística. Na SIC Notícias, um repórter afirmou, com toda a certeza deste mundo, que a polícia andava «em perseguição aos comerciantes»; uma coisa incompreensível já que, embora muitos sejam ilegais, costumam ir para a rua fazer negócio sempre que o Porto ganha no futebol. Tudo isto é educativo. Por vezes uma pessoa até pensa que vive num país ficcional e inventado. PL
ONDE ESTÃO? Há vários dias que não vejo nenhum naco do real, nenhum acontecimento burlesco, nenhuma boa portuguesada, nenhuma pérola do mundo dos fenómenos. Está bem que não costumo andar de táxi nem ouço regularmente o Forum TSF. Mesmo assim, não percebo esta diminuição de percentagens. Ou sou eu que ando distraído ou o mundo está a ficar decente e arrumado. PL
HUMOUR: 13 dias depois, o Ricardo dignou-se a responder ao meu post sobre a relação entre o humor e a política. E que diz o Ricardo? Diz que o esquerdismo não o atrapalha nada e que não há coisa mais engraçada do que ser comunista em 2003. É assim: em 2003, na sua pele de comunista, o Ricardo ri-se consigo mesmo. E nós, não-comunistas, rimo-nos dele. Destinos de humorista. PL
AH, E JÁ AGORA: Sendo o evento dedicado em parte aos blogs, pedimos aos bloggers presentes que não se acanhem e se dêem a conhecer. Antes, durante e depois da sessão. Nós não mordemos. PM
É A CULTURA #3: É hoje às 18.30, no Jardim de Inverno do Teatro S. Luiz, a terceira sessão de «É a Cultura Estúpido», esse evento completamente à borla para todos (incluindo para nós, grumpf). Desta vez será um pouco diferente, com apenas dois temas: livros de Verão (sugestões de ZMS, Nuno Costa Santos, João Miguel Tavares e minhas) e... blogs (presenças confirmadas: Mariana Vieira da Silva do País Relativo, Marta Almeida do Janela Indiscreta, Tiago Cavaco do Voz do Deserto e Nuno Miguel Guedes do Tradução Simultânea). Modera, como sempre, Anabela Mota Ribeira, e fecharemos com o stand-up de Ricardo de Araújo Pereira. Esperam-se piadas sobre Nelson de Matos. PM
NBP: Janto numa das chafaricas do costume. A certa altura, a minha capacidade de discutir as vantagens de Abu Mazen sobre Arafat obnubila-se, e fico grudado à mesa do lado, ocupada por um moço e por uma moça. A moça não é realmente bonita, mas é um case-study de sedução em tudo o que diz e no modo como o diz, como se mexe, até como come. No dia seguinte descubro, por acaso, que é uma actriz conhecida da televisão (quase não vejo tv). O que me leva a perguntar: como isto da crítica literária não rende, será que a NBP não me quer contratar como olheiro? Limitava-me a ir a sítios selectos, ficar de olho e fazer um relatório. Ou seja, mantinha os meus hábitos quotidianos e ainda era pago por isso. Olha que bela ideia. PM
E QUEM NÃO SALTA É DE EXTREMA-DIREITA: Carvalho da Silva diz que a «extrema-direita social e política» está no poder. Isto é, a bem dizer, uma não-notícia, porque para os camaradas do sr. Silva «direita» e «extrema-direita» são sempre sinónimos. Mas fico sempre a pensar o que aconteceria se a extrema-direita chegasse ao poder. Talvez o sr. Silva inventasse uma nova designação. Daquela cabeça espera-se tudo. PM
NEM AS VARINAS O SALVARAM: Depois da distrital, o inenarrável Narciso Miranda perdeu a concelhia do Porto do PS. Uma boa notícia, mesmo se estamos longe de termos uma asmática admiração por Nuno Cardoso. Em todo o caso, parabéns a Francisco Assis e a Mark Kirkby. PM
CRP: Pires de Lima, do PP, a propósito da questão da (in)constitucionalidade do Pacote Laboral, disse que o país não pode ficar «refém» da Constituição. É uma infelicidade verbal tremenda. A CRP já não é a Constituição marxista de 76, foi profundamente alterada, mesmo se nem sempre da melhor maneira, e se ainda tem pontos discutíveis então que se discuta a sua alteração, mas nada justifica frases assim. As leis podem estar mal feitas, mas até serem mudadas os cidadãos não estão reféns, estão obrigados. Às vezes o PP tem estes deslizes de discurso que dão razão a certas críticas da esquerda. É pena. PM
TRÊS COISAS QUE NÃO CONSIGO EVITAR:

1. Sujar a toalha nos restaurantes chineses.
2. Interromper a leitura do Jornal de Letras mal lhe pego.
3. Ver a SIC-Notícias e distrair-me das notícias.

PM
VOZES: Bem sei que a pedofilia não é apenas nem principalmente uma questão política, mas podemos dizer que é política em sentido lato. O que é curioso é o modo como ouvimos as pessoas discutir este assunto em cafés em restaurantes: em vez de, como é próprio em discussões políticas, elevarem a voz, baixam a voz até ao murmúrio. PM
CORREIO: O Correio dos Leitores é uma rubrica essencial na Coluna. Por isso aqui deixamos alguns tópicos a propósito:

1. Temos recebido mails sobre a pedofilia e o Iraque. Sobre o primeiro tema, não temos dito muito, por razões que explicámos, mas em breve dedicaremos várias reflexões aos acontecimentos. Sobre o Iraque, fizemos apenas uma moratória, visto que discutimos o assunto diariamente durante semanas e semanas. Mas temos anotado as questões relevantes e responderemos a elas em breve.

2. Queremos agradecer os mails e telefonemas de apoio depois da nossa polémica com a Moca de Fafe. Alguns bloggers e alguns amigos disseram-nos, e bem, que não devemos perder a compostura só porque os cafagestes de direita entraram na blogosfera, e que mais vale o humor habitual na Coluna e um desprezo olímpico. Assim será, daqui para a frente. Mas depois de acusações veladas e de posts públicos a discutir mails privados, não podíamos manter a calma. Com tal bando não chegam modos brandos.

3. Quero pessoalmente agradecer às senhoras e meninas que me agraciaram com mails com festinhas cibernéticas, e também o facto de terem percebido que posts mais confessionais e/ou melancólicos não são técnicas de engates. Há netdates que resultam (cof cof) mas eu não sou utente. Mails simpáticos, esses são sempre bem-vindos.

4. Eu leio todos os mails, publico e respondo a alguns; o PL lê todos os mails e publica e responde de vez em quando; o JPC lê de vez em quando e não responde. Assim, a vossa correspondência deve ter em atenção esta distribuição de tarefas.

5. Pedimos que assinem os mails. Mails com pseudónimos abstrusos não serão publicados.

6. Este é um blog de política mas também de muitos outros assuntos; não se acanhem. Só não discutimos as teses do João Magueijo, porque não fazemos ideia, mas de resto estejam à vontade.

7. Não é segredo que somos de área política do actual Governo, mas não temos com os respectivos partidos qualquer compromisso; por isso, não enviem críticas aos partidos dirigidas a nós. Não temos sequer o mail dos ministros para fazer o reenvio.

8. Tenho recebido mails na minha morada pessoal; enviem antes para o mail da Coluna: colunainfame@hotmail.com

Deus vos pague. PM

terça-feira, junho 03, 2003

DIREITOS: A Esquerda anda a estrebuchar sobre as agressões aos direitos dos arguidos no processo penal. Perceberam finalmente que há direitos mais importantes e mais sérios do que os direitos dos animais, das plantas e das mulheres. PL
O PAULINHO DAS BOLAS: Um dos grandes momentos deste fim-de-semana foi a despedida de Paulinho Santos do futebol profissional. É pena. Agora, quem lhe quiser bater, só fora dos estádios. PL
AS ARMAS: O Manel chega de França, põe as malas no chão, visita a Feira do Livro à procura de um tratado de Marcuse e começa depois a arengar sobre as armas de destruição maciça. Pois é: ainda não se descobriu nada mas atenção Manel, se os americanos ainda podem descobrir alguma coisa, os vossos extraordinários presságios bloquistas não se concretizaram: os Estados Unidos estão a fazer um trabalho limpinho no Iraque e ainda não falsificaram nenhuma arma de destruição maciça para justificar a intervenção. O que é estranho é não ouvir ao Manel uma palavra sobre a brutalidade do regime de Saddam. Essa sim está a ser descoberta e com uma dimensão de terror absolutamente inimaginável antes da guerra. Não digo que a descoberta de armas químicas, biológicas e nucleares seja uma questão irrelevante. Não é; mas eu sempre defendi que a razão da intervenção no Iraque esteve mais naquilo que o regime de Saddam poderia fazer se continuasse intacto do que no combate a estas armas de destruição. Mesmo não tendo um especial arsenal de armas proibidas, o regime de Saddam poderia facilmente obtê-las e utilizá-las, sem grandes dificuldades e iludindo a comunidade internacional. Numa palavra, poderia fazer no futuro o que andou a fazer vastamente no passado. Foi isso que fez desta guerra uma guerra preventiva e dizermos que a ausência de armas de destruição maciça torna a guerra ilegítima, é não compreendermos o significado de uma guerra destas. PL



GUARDA-ROUPA: A propósito do famoso artigo de José Manuel Fernandes sobre a indumentária do juiz Rui Teixeira, tenho que dar o meu próprio exemplo. Diz-se que o juiz representa um órgão de soberania, e que por isso tem de vestir formal e condignamente, visto que t-shirts e jeans são incompativéis com a dignidade da função. Mas reparem: eu sou um notório defensor das classes possidentes e exploradoras, um lacaio da alta burguesia, um prócere do grande capital, um indefectível até da aristocracia monarquizante, e no entanto sou um farrapo de aspecto, barba por fazer, pêra insubmissa, cabelo ao vento, levi's, fralda de fora, camisolas com desenhecos. Será que isso me desqualifica como porta-voz dos poderosos e abonados? Não me desgracem. PM
SLBCP: Fico espantado pelo modo como as pessoas detestam o Benfica. Não os portistas, que esses é normal, mas em particular os sportinguistas, como a Mariana e outros. Pois aqui fica a confissão, que provavelmente soará a heresia: eu sou benfiquista mas simpatizo com o Sporting; mais: eu até devia ser do Sporting, um clube muito mais distinto e elitista, menos garrafão de tinto e música pimba que o SLB, mas, por qualquer razão, dei em encarnado. Além disso, que diabo, o Sporting é um clube da minha cidade, e eu prefiro sempre a vitória de um clube lisboeta do que de um clube de Santo Tirso ou seja lá o que for. Não peço, ó sportinguistas iracundos, que me acompanhem, mas ao menos admitam-me como espécie protegida de relevante interesse ecológico. PM
NOT ME: Sempre que alguém me aborda e me pergunta «você é que é o Pedro Mexia?», eu, talvez por causa daquele «é que é», quero sempre responder como Drummond: «não sou não, desculpe, mas passam a vida a confundir-me com ele». PM
MUITO CÁ DE CASA: Lloyd Cole fez ontem um showcase na FNAC, para apresetar o seu novo disco, Music in a Foreign Language, que é lançado na próxima semana. Lloyd é uma visita muito cá de casa: poucos artistas terão vindo tantas vezes tocar entre nós (julgo que esta foi a sexta vez que assisti a um concerto do escocês). O rapaz está espantosamente bem conservado: mais magro, sem barriga, cabelo curtinho com uma boa madeixa grisalha. Veste-se, ainda de preto, e tem, terá sempre, aquela boca rasgada, quase de escárnio, e aquele ar um pouco antipático, ele que é o mais simpático e educado dos artistas pop. Discreto e afável, mas pouco falador, Lloyd apresenta os temas do novo álbum, incluindo o tema epónimo, super-pop e fresco, um mais dilacerado «My Other Life» e pelo menos um outro tema notável que não sei como se chama, para além do nosso já conhecido «Fool for Love». Depois, uma pitada de clássicos, como «Mainstream» (uma versão mais lenta e mais suave, como quase todas) ou «Rattlesnakes», passando por «No Blue Skies», da sua fase «nova-iorquina» e agressiva. Também uma «cover» dos Velvet, «Pale Blue Eyes», porque temos que respeitar os mestres, e os olhos azuis do próprio Lloyd tremiam de vivacidade e satisfação, visível a cada aplauso. Mas porque o sr. Cole não recebe lições de songwriting de ninguém, tivemos «Like Lovers Do», o ponto de rebuçado entre lirismo e cinismo, e (a pedido de um espectador) «Butterfly», o momento mais emocionante deste fim de tarde, todo ele violência sexual em understatement lírico. E depois, calmamente, simpaticamente, o sr. Cole agradeceu, com uma ligeira vénia, fez aquele sorriso de satisfação contida e, com a sua impecável sobriedade e bom-gosto deixou-nos com a sensação do dia ganho. PM

segunda-feira, junho 02, 2003

PUTA DE VIDA: Um fulano é fotógrafo da Maxmen, vive a tirar o boneco dos mulherões da moda, da tv e da cassete pirata, chega à reunião e vê o trabalho a ser distribuído assim: «tu, X, vais fotografar a Isabel Figueira em roupa interior; tu, Y, vais fotografar a Carla Salgueiro de bikini; tu, Z, vais fotografar a Alexandra Lencastre dentro dos lençóis; e tu, W, vais fotografar o Pedro Mexia». Puta de vida. PM
UM MEXIA, DOIS MEXIAS, TRÊS MEXIAS: A esta hora já se terá espalhado entre alguns leitores a horripilante novidade: PM na Maxmen deste mês (misericordiosamente vestido, descansem). Mas quero esclarecer que aquilo que aparece na página ímpar não sou apenas eu: como se vê pelo espaço que ocupa o corpanzil, aquilo sou eu e mais dois primos direitos que estavam de visita. PM
DIÁLOGO:
- És heterossexual?
- Sou, mas não praticante.
PM
COMPENSAÇÕES CAPITALISTAS: O fim-de-semana foi pior do que ver a tv shop em noite de insónia, mas ao menos o hotel era muito bom. PM
PALAVRAS: Uma das palavras que eu não gosto nada é «comissário»; tem um aspecto terrível de RDA, mesmo que seja apenas uma exposição de fauvistas na Culturgest; mas também tremo perante a designação «praesidium», e basta isso para desconfiar seriamente da Convenção do sr. Giscard. PM
PODIAM TER PERGUNTADO: Os adeptos da «alterglobalização» dizem que «um outro mundo é possível». Claro que é: basta ser bom para as pessoas, não roubar velhinhas, estimar o cágado, não encornar o primo, visitar os doentinhos e comungar pela Páscoa da Ressureição. É a melhor maneira de tornar possível um outro mundo. E isso eu sei desde os cinco anos. Podiam ter perguntado. PM
BEST WISHES: De regresso, leio mais posts curtíssimos no BdE, e verifico que ser de esquerda é basicamente como estar apaixonado: lirismo, optimismo, voluntarismo, a certeza de que, contra todas as dificuldades, tudo vai acabar bem. Desejo que, neste caso, seja mesmo verdade, porque em política bem sabemos que não é assim. PM
AI QUE MEDO: Tardou mas chegou: um blogger despenteado mental ameaça-nos veladamente com o recurso à acção directa, vulgo pancadaria grossa. Eles são muito intelectuais, muito catedráticos, mas anseiam sempre é por dar uso à matraca. E como nós nos chamamos Pedros, apanharemos só por causa desse nome infame. Mas coragem, daquelas bandas, é como crucifixo ao pescoço de um ateu: mero enfeite sem uso. Por isso, podem encontrar-nos nos sítios habituais, e sem escolta policial. PL / PM

sábado, maio 31, 2003

FIM-DE-SEMANA: Vamos estar out este fim-de-semana. O PM foi para o Porto e estará presente amanhã, dia 1, na Feira do Livro do Porto (debate sobre poesia com Jorge Gomes Miranda, Luís Quintais, João Luís Barreto Guimarães e José Ricardo Nunes); o JPC anda a tratar do Isaiah Berlin como ainda ninguém o fez ainda e eu vou ver o mar que também é preciso. Bom fim-de-semana. PL
DURMAM BEM: O post de ontem, absolutamente necessário face a uma série de indignidades (muitas das quais se passaram fora dos blogs, e que por isso os nossos leitores não conhecem), foi o último em polémica directa com os «pensadores» da Nova «Democracia». Deixamos, a partir de agora, esses senhores sozinhos, a vociferar contra o sistema e a Constituição. Daqui não levam troco. Durmam bem. PL / PM

sexta-feira, maio 30, 2003

TAL COMO A PEDOFILIA? Li mal ou Miguel Sousa Tavares, no artigo que assina hoje no Público sobre a Casa Pia, escreve que transformar as escutas telefónicas num método de investigação rotineiro, é tal como a pedofilia, crime. É sem dúvida crime; mas não como a pedofilia. Porque não há crime como a pedofilia. Mais atenção à linguagem, senhores. PL
FUNDAMENTOS: Li o despacho (publicado no Indy) que ordenou a detenção e levantamento da imunidade parlamentar de Paulo Pedroso. Os fundamentos são frouxos, as ilações extraídas das escutas telefónicas muito discutíveis. Quero crer na existência de outros elementos, de outros indícios, mais sólidos, para justificar a prisão preventiva de Pedroso. O processo contra Pedroso não pode ser apenas isto. Apesar desta indistinta rede de circulação de informação, que envolve juízes, procuradores, políticos e a Felícia judiciária, insisto que não sabemos tudo. PL

TELENOVELA: A notificação ao domingo não foi de muito bom gosto, o «pode ser» do Procurador foi bastante bizarro mas este jornalismo de telenovela que anteceu a ida de Herman José ao DIAP atingiu o cúmulo do grotesco. Durante toda a semana, as televisões foram-nos dando xaroposas entrevistas a Herman, indagando do seu estado de espírito, visitando-o no restaurante, nos ensaios, procurando enternecer o público para o que viesse acontecer ao humorista. Como se Herman, em vez de ir depor num processo judicial, fosse tirar um rim ou uma verruga maligna. A encenação tem limites. PL
ISSO VEM EM QUE ARTIGO? Sampaio pede a famosa «serenidade», diz que estará atento, mas que, em última análise, tem poderes sobre todos os órgãos de soberania. Ok, o PR pode dissolver a Assembleia, demitir o Governo, mas o que pretenderá fazer com os tribunais? Constitucionalistas, por favor, expliquem-me o que vai na cabeça do Jorge. PM
BUSINESS AS USUAL: Mesmo que as coisas corram mal hoje na Tribunal de Instrução Criminal, o dr. Balsemão manterá o programa do nosso único humorista, embora com um nome novo: Herman TIC. PM
A VANGUARDA DIREITISTA: Era de esperar. Conhecemos a honestidade intelectual desta pandilha. Um blogger miguelista parodia um texto da Coluna; até aqui, nada de mal, a paródia é livre e aconselhável, mas o dito senhor não faz o respectivo link, para os leitores poderem confrontar o texto. Chama-se etiqueta, mas talvez esse senhor ainda não saiba os elementos básicos indispensáveis à comunidade bloggística. A sua intervenção é compreensível: o cavalheiro defende um partido, do qual é um dos pensadores (valha-nos Deus). Um partido Regenerador, no qual não haverá idiotas, corruptos, fontes anónimas, conspirações em sótãos, guerrilhas internas, bocas nos jornais, um partido, em suma, que não fará política. O monteirismo é essa patetice: um partido unicamente unipessoal, que nasce do revanchismo saloio, e que pretende, ó justos céus, corrigir os vícios da política portuguesa, começando a disparar sobre todos os órgãos de soberania, e mesmo prometendo um regime «novo» (sabemos qual). Lamentamos que nesse partido estejam duas ou três pessoas por quem temos estima, mas os outros, meus amigos, são uns direitosos do mais rasca que a direita produziu, liderados por uns intelectuais desocupados e esgroviados. A maralha monteirista não tem ideias: basta ver a paupérrima e vaga declaração de princípios. Estes intelectuais reaças têm: e sabemos muito bem quais são. A principal ideia das luminárias é a de que vivemos numa democracia a fingir, onde toda a gente é de esquerda, porque a direita, para eles, é evidentemente de esquerda. O PNR, ao menos, junta uns nostálgicos a valer, e pelo menos nostálgicos dum senhor que sabia escrever português. Os monteiristas, pelo contrário, são liderados intelectualmente por gente que gostava de ter o talento para a imprecação de um José Agostinho de Macedo, o nosso virulento reaccionário. Mas talento não ronda por aquelas paragens: é gente que julga que alguém se impressiona com grossas teses de doutoramento, com citações freneticamente cosidas, e com uma pose minoritária que julga que da minoria (da minoria ínfima) é que vem a razão. São a vanguarda direitista, esses grandes inimigos da esquerda que passam a vida a atacar e boicotar a direita, esses «puros», impolutos, essa gente que não suja as mãos, mas que manda piadas, indirectas, sem citar nomes, com uma desonestidade intelectual que bem conhecemos dos seus manuais grotescamente «eruditos». Sr. Prof. Maltez, quando se polemiza citam-se as pessoas com quem se polemiza; o contrário é cobardia. Nada que nós não saibamos. Daí, desse pântano a que provisoriamente chamam o «monteirismo» - até escolherem outro espantalho que vos sirva - já estamos habituados a uma coragem da boca para fora, portuguesinha, «agarrem-me senão bato-lhes». Mas nunca tiveram coragem para dizer o que realmente pensam, nunca tiveram coragem para dizer que querem Portugal fora da União Europeia, pobretes e alegretes, com jaquinzinhos e modinhas minhotas. E depois vêm com um pateta discurso de ressentimento social, de descamisados da treta, remetendo para as ideologias que bem conhecemos. E depois atacam os partidos do governo como indirecta para nós, os bloguistas da direita democrática, como se nós fossêmos paus-mandados deste ou de qualquer outro governo de direita. Leiam os nossos arquivos e o de outros blogs: nunca nos escusamos a criticar este ou qualquer governo de direita, sempre que achamos que procederam mal. Por isso, bocas ao PSD e ao PP devem ser endereçadas aos respectivos partidos. Os senhores pensam que nós não conhecemos a maralha que agora, provisoriamente, aderiu ao «monteirismo», que nunca jantámos à mesma mesa, que não sabemos o que acham deste regime, que não conhecemos os retratos que têm em casa, ou os líderes estrangeiros que veneram. Aqui na Coluna Infame repudiamos totalmente essa pseudo-vanguarda ignóbil, casca-grossa, que representa tudo o que de pior tem a direita em Portugal. Felizmente, o eleitorado não é parvo, e saberá dar-vos as décimas que merecem, e que depois regressem às vossas bibliotecas integralistas, poeirentas e com bustos, vociferando, à frente da mulher-a-dias, contra esta Pátria ingrata que não vos merece. E depois, bem sabemos, escreverão o livro imortal, colossal, que vai varrer com este gente toda, direitistas sem complexos nem taras autoritárias e toda a esquerda comedora de criancinhas. Trememos perante tal apocalipse. PL / PM

quinta-feira, maio 29, 2003

NÁUSEA: Reparem como Manuel Monteiro, numa penada, se atira ao Presidente, ao Procurador-Geral da República, à oposição e ao Governo. Nenhum órgão de soberania escapa ao seu dedo acusador. É um santo, este varão. Salva-se o povo mas o povo, vejam bem, o povo é vilipendiado pelo sistema. O povo não pode ser insultado. E, sabendo disto, sabendo da imundície do sistema, Monteiro não quer oprimir mais o povo. Monteiro precisa do povo. Em troca, oferece generosamente a sua virtude, a sua frescura, a sua originalidade. É um político novo, sem passado, sem vícios, sem outros interesses que não os da sua sanha reformadora. Há muito que a Pátria precisava de um político assim; de um político de ruptura que ponha termo a este marasmo de incompetência e promiscuidade. Eu humildemente afirmo desconhecer o que Manuel Monteiro pensa do sistema, do regime ou da política. Sei que pensa mal. Facto notório. Mas permito-me relembrar aqui uma curiosidade: Manuel Monteiro é um genuíno produto do sistema e do mesmo sistema que anda agora a criticar. Agremiações juvenis a brincar ao poder, partidos, votos comprados com política rasteira, eleições circenses, tacticismo parlamentar, conveniência acima das convicções políticas: é extraordinário como Manuel Monteiro passou por tudo isto, como Monteiro é um perfeito produto desta inglória misturada. Sem o sistema, Monteiro estaria em todo o lado menos na vida política, para a qual, de resto, não se lhe reconhecem méritos assinaláveis. Esta pose moral, esta juventude falsa, este portuguesismo tradicionalista, desculpem, causam-me náuseas. Náuseas. PL
DEMOCRACIA: Os milagres acontecem: numa livraria portuguesa, vejo um livro de Paul Johnson ao pé dos pensamentos de Mao Tsé Tung e outro de Bernard Lewis lado a lado com comrade Chomsky. Assim sim. PL
RECTIFICAÇÃO: Antes que chovam protestos, tenham em atenção que só contam livros (e prisões) de Almeida Santos posteriores ao 25 de Abril. Obrigado. PL
FINALMENTE: Segundo o Público de hoje, o Ministério Público enviou para o Tribunal Constitucional um parecer, considerando que a sigla ND, do novo partido político de Manuel Monteiro, se confunde com a sigla MD, do Movimento dos Doentes. Se não me está a escapar nada, eu não diria apenas que as siglas são confundíveis. Arrisco dizer que, para além dessa confusão, a Nova Democracia e o Movimento dos Doentes foram certamente fundados pelas mesmas pessoas. E ainda dizem que o Ministério Público não trabalha. PL
PRISÃO: Ontem, à saída da prisão de Lisboa, António Almeida Santos declarou aos jornalistas que «a prisão é o melhor sítio para se ler e escrever». Tem toda a razão. E, por isso, quem conheça algum dos numerosos livros do próprio Almeida Santos, só pode lamentar que ele nunca tenha sido preso. PL
HAND JOBS: Catarina Furtado em declarações a revista social: «Tenho uma óptima relação com o meu corpo». Mas não teremos todos? JPC
O CASO BELGA: Já aqui lembrámos, a propósito da pedofilia, o caso belga. Publicamos a seguir um testemunho, longo mas relevante, sobre essa situação, por um português que a presenciou in loco.

Concordo vivamente com uma abordagem comparativa entre a situação sócio-política gerada pelo actual processo de inquérito e o ocorrido em 97/98 na Bélgica.. Permitam-me que esclareça alguns pontos relativos a este último, baseando-me no facto de ter vivido em Bruxelas exactamente aquando da explosão mediática causada pela publicação dos hediondos eventos então ocorridos. Pois bem, tais crimes ocorreram algures numa cave duma residência localizada nas Ardenas, na qual o Sr Marc Dutroux e a sua esposa encarceravam crianças, obrigando-as a cometer perversos actos sexuais, assassinando-as brutalmente, dilacerando os seus corpos que eram depois estrategicamente enterrados no quintal. Tal facto terá ocorrido ao longo de qautro anos, mesmo após este casal ter sido dado como suspeito, aquando do desaparecimento duma menina de origem magrebina, tendo sido mesmo efectuada uma revista à sua residência sem que as infernais masmorras tivessem sido descobertas pelo agentes encarregues da investigação. As semelhancas comecam exactamente quando dois membros do governo belga da altura são indiciados como testemunhas, e posteriormente como arguidos, tendo-se assistido a uma escalada infame de nomes públicos ligados aos mais diversos sectores, desde políticos a diplomatas, jornalistas, economistas; se bem me lembro o processo chegou a ter mais de 300 testemunhas e 30 arguidos, um verdadeiro escândalo. Toda uma rede estrategicamente montada e revelada da forma mais brutal, clientes dos mais variados quadrantes socio-politicos contratam o casal para a realizacao de snuffs (pequenos filmes registando actos de índole sexual e violenta sobre crianças) pagos a peso de outro e distribuídos por toda a Europa. Esta situação levou a sociedade belga a organizar as Manifestacoes Brancas, únicas na história daquele país, nas quais chegaram a participar 200 mil cidadãos, valões, francófonos, germanófilos, envergando t-shirts simplesmente brancas como testemunho de indignação para com o lastimável processo. Dutroux é transferido de estabelecimento prisional, o seu julgamento é adiado sine-die, a justica é fortemente abalada por fugas estratégicas para o estrangeiro, o escândalo atinge altos magistrados da nação, e surpreendentemente, passados cerca de seis anos, apenas Dutroux se encontra encarcerado, tendo-lhe sido possível escapar por duas vezes aos calabouços por conveniências várias que ainda se encontram por explicar. Até a sua esposa teve pena atenuada, sendo-lhe possível efectuar visitas domiciliárias. A sociedade belga, estigmatizada pelas suas próprias divisões internas, nunca recuperou deste hediondo escândalo socio-político.

Em Portugal, lamento encontrar semelhanças no acompanhamento deste processo, muito especialmente pelos órgãos de comunicação social, onde ainda ontem, na RTP1 podemos presenciar, incrédulos, a perseguição, a pé, por parte duma jornalista, ao magistrado do TIC responsável pelo processo, inquirindo-o acerca de alguns pormenores suspostamente relevantes. Fugas de informação successivas desviam as atenções alimentando a autofágica euforia dos tablóides, altos magistrados proferem declarações inacreditáveis, agentes políticos lançam suspeitas sobre as próprias instituições responsáveis... Infelizmente, este tipo de atitude apenas prejudica todos aqueles que sofreram as provações físicas e psicológicas causadas por comportamentos doentios, as vítimas deste processo. Haja respeito por elas, pelo processo, pelas instituições, pelos arguidos, pelas testemunhas, por todos nós.
(André Barbosa)
ADENDA: O mesmo dizemos, sem hesitar, da jornalista do PÚBLICO, Alexandra Lucas Coelho, que aliás sempre me pareceu ser sobretudo uma repórter. O que vale para o JM «à direita» vale para a Alexandra «à esquerda». Como vêem, não dizemos mal, por sistema da imprensa tradicional, nem das pessoas «do outro lado», muitas das quais respeitamos. Difícil mesmo é dizermos alguma vez bem do Expresso. PM
JMT: O nosso amigo João Miguel Tavares regressou do Iraque. Os textos que o João Miguel publicou no DN nas últimas duas semanas merecem ser aqui louvados, porque mostram como se pode fazer jornalismo sério, bem pesquisado, bem escrito, ponderado, sem cair na esparrela da «imparcialidade». O JM não escondeu a sua opinião: foi objectivamente bom varrer aquele regime, mesmo com erros e com imensas dificuldades à vista. E o Diário de Bagdad que escreveu misturava, sem falhas, a curiosidade, o humor, a emoção, sempre em notas pertinentes E de português irrepreensível. Pois é, meus amigos, é possível ser «de direita» e ser um profissional sem mácula. Resultado ao fim dos noventa minutos: Tavares 4 Fisk 1. Bem-regressado, João Miguel. PM
NA MINHA RUA: Não tenho, nestas anotações, nenhuma tese (poupem-me a polémicas estéreis). São duas curiosidades, realmente acontecidas:

Na minha rua, alta noite, seguia uma rapariga pouco mais nova que eu, fisicamente encorpada, muito morena, vestida, acho, de azul. Vejo-a passar e, por qualquer razão (vislumbre rápido do rosto?) penso «este mulher está em plena euforia sexual». Quando dobrei a esquina, vi a rapariga parada ao pé da farmácia, a meter moedas numa máquina de preservativos.

Na tabacaria ao cimo da minha rua, entro, de manhã, para comprar os jornais. Folheando revistas está um senhor com cinquenta e muitos anos, pequeno, de barba grisalha curta, casaco cinzento e óculos. Um cidadão vulgaríssimo. Suspeito: «este tipo é um esquerdista encartado». Ao sair, já com os jornais, ouço-o pedir: «era o Monde Diplomatique, se faz favor». PM

quarta-feira, maio 28, 2003

ALMODOVAR ME MATA: Almodovar... over-rated or what? Típico cineasta que é bem gostar se se é de esquerda or what? É obvio que não se safava se não fosse espanhol or what? Se responderem what a qualquer uma delas deixo de vos ler. (Tyler)

Caro Tyler: se me perguntasse há uns anos diria, sem hesitar: over-rated. As comédias descabeladas tinham a sua graça, mas eram demasiado descabeladas para o meu gosto, demasiado kitsch. Só gostava verdadeiramente de Matador, um filme hiper-pretensios que gostava de rever para reavaliar, mas que na altura me caiu no goto. Almodovar tinha o seu interesse para teses sobre «A Espanha pós-franquista», «A Movida e a Cultura» e assim por diante, mas pouco mais. Comecei a mudar de opinião com Carne Tremula, um filme de uma dureza, de uma economia e de um erotismo sujo admiráveis. Não sou um incondicional de Todo Sobre Mi Madre, muito meladrama kleenex por um lado e muita piada fácil por outro. Mas com Habla con Ella rendi-me. É um filme magnífico, magnificamente escrito e filmado, com uma justeza emocional rara, e torneando com brilhantismo os perigos do «infilmável» (a violação). Politicamente, não creio que Almodovar seja particularmente de esquerda, excepto o antifascismo do costume e a gayzice. Mas é, claramente, um tipo fascinado por Hollywood, por uma Hollywood onde Fassbinder vingasse. É um Todd Haynes com salero, «maricón» onde o outro é «queer», e pícaro onde o outro é cínico. É um Sirk de caracóis. Podia ser pior. PM
ISSO, AÍ, OH SIM, CONTINUA: Não costumo gostar do que escreve o Prof. Rosas, muito menos recortar. Mas o seu ARTIGO de hoje parece-me deveres interessante. Rosas, no seu texto, lembra como neste processo da pedofilia temos assistido a um comportamento incrível da... direita (palavra de honra). Aprecio particularmente o segundo parágrafo, que vou citar sic:

A direita açula, desta forma, e fá-lo conscientemente, os instintos mais primários de um sector da opinião pública cansado ou desiludido \uF8E7 e geralmente com razão... \uF8E7 com o poder político e a governação, mas profundamente despolitizado e civicamente apático, facilmente manipulável pela demagogia populista de direita e de extrema-direita contra "a política" e os "políticos" como um todo. Isto é, facilmente disponível para, na enxurrada das frustrações e das revoltas acumuladas, se deixar transformar em tropa de choque contra a própria democracia e as liberdades públicas. Nem vale a pena estar a recorrer aos exemplos históricos para sabermos como este tipo de demagogia pode acabar. Os sinais estão aí. Uma espécie de caceteirismo fascizante que vem espreitando a nossa vida política \uF8E7 veja-se a arruaça de Felgueiras \uF8E7 e que a direita, naquele jeito inaugurado por Paulo Portas de se pôr de fora da "política", parece querer manipular a seu favor abrindo a caixa de Pandora.

O que há aqui de novo não é a ideia de que a direita «açula» os «instintos mais primários» no seu jeito de «caceteirismo fascizante». Isso é o normal, vem no Word do Prof. Rosas e cada artigo tem que ter um parágrafo assim. O que eu acho extraordinário é este \uF8E7 quatro vezes repetido (na edição on-line e em papel). Gralha? É demasiado óbvio como explicação. É possível que se trate de um código: enquanto o Prof. Rosas fala em português para os leitores do PÚBLICO, acrescenta frases herméticas para os bloquistas (do género: «razão tinha o Otelo com aquilo do Campo Pequeno»). Mas eu tenho outra tese. O Prof. Rosas, excitado com a ideia que a extrema-direita tem 50 % dos votos, perde o controlo das teclas, e desliza da sintaxe ainda ortográfica para o frenesi signíco (ena). É um fenómeno conhecido dos que experimentaram alguma vez sexo virtual: começa-se por escrever «o que é que tens vestido?», depois «despe-te», etc etc, e quando se está no «isso, chupa» perde-se, por qualquer razão, o domínio sobre o teclado, e começam a aparecer coisas como »ergspte3rt9oreteo+rpti», «9trg8sr9igusigfsugfiosd» ou mesmo «dfsfffdfkdfkfdçfdçfd纻. O Prof. Rosas, como bom bloquista, é um orgásmico incontido, imaginando sempre moínhos de vento, que assumem sempre a forma de «fascistas». Vai daí, desata a escrever sobre a hidra, baba-se, tem uma erecção, e pronto: «\uF8E7» quatro vezes (uma boa média). E depois desliga o computador e vai dormir. PM
ELEFANTE BRANCO: Quanto ao vencedor de Cannes, Elephant, espero para ver. Gus van Sant é capaz do melhor (Drugstore Cowboy, To Die For) e do pior (My Own Private Idaho, Gerry), mas cheira-me que este elefante pertence à primeira categoria. A ideia de tratar o tema do massacre no liceu de Columbine sem nexos de causalidade, explicações de pacotilha e demagogias só pode ser um antídoto para o detestável senhor Moore, que entretanto prepara um filme sobre o 11 de Setembro (que talvez se venha a chamar É Bem Feito!). Mas estou muito curioso pelos novos de Lars Von Trier, Gallo e do nosso mui amado Clint Eastwood. Sobre o mais recente filme de Clint, aliás, gostava de assinalar isto: as estrelas são os dois actores mais esquerdistas do panorama americano, Sean Penn e Tim Robbins. Imaginem o Oliver Stone a fazer um filme com o Bruce Willis. Pois. PM
TELEFONEMA PARA TÓQUIO: O Eurico de Barros passou, oficialmente, a Infame honorário, e opina, em exclusivo para a Coluna, sobre o festival de Cannes, de onde acaba de regressar.

Compartilho com os Infames e seus leitores algumas pérolas de Vincent Gallo, autor do individualíssimo, tristíssimo e belíssimo «Brown Bunny» no Festival de Cannes. Sovado até ao osso pela crítica americana no dia a seguir à projecção do filme - que, entre outras qualidades, tem Chloe Sevigny a fazer uma fabulosa chamada para Tóquio a Gallo -, o filme foi defendido pela «crítica de referência» francesa, leia-se «Monde» e «Libé». Ora Vincent Gallo, apesar de ter aspecto «alternativo» e de ser realizador/músico/pintor «maverick», é militante (de carteirinha) do Partido Republicano. Orgulha-se de ter apertado a mão de Richard Nixon, e elogia Ronald Reagan e Charlton Heston a quem o quer ouvir. Quando um crítico de um dos dois jornais acima citados o inquiriu sobre as semelhanças de «The Brown Bunny» com «Easy Rider», Gallo respondeu: «"Easy Rider" é um filme de "hippies" e eu não gosto deles. Gosto mais dos filmes onde os polícias são os bons e os "hippies" os maus». E citou o esquecido mas magnífico «Electra Glide in Blue» (1973), de James William Guercio, onde o herói é um polícia da estrada. Cada vez gosto mais do Vincent Gallo! (O filme foi comprado para Portugal e vai estrear em cinema de certeza).

Eurico de Barros
FAIXA DE GAZA: Cinco da tarde, passeio pelos territórios ocupados, vulgo Chiado. Sou de certeza, num espaço de quinhentos metros, o único tipo que prefere a Carrie-Anne Moss ao Keanu Reeves. E ainda dizem que não tenho empatia pelos palestinianos. PM
EXCESSO DE TECNOLOGIA: Passo pelo Rato, primeiro pela Procuradoria e depois pela sede do PS. Não sei como não me tinha apercebido dessa proximidade flagrante. O que me leva à seguinte questão: para quê escutas telefónicas, senhores investigadores? Basta um vulgar copo de água contra a parede. PM
AH PORTUGAL SE FOSSES SÓ QUATRO SÍLABAS: Dezenas de livros novos, dezenas de merdices, quase todos romances atamancados, lamurientos, foleiros. Nem de propósito, encontro F., um dos nomes essenciais da literatura portuguesa actual. Elogio-lhe vivamente a obra. Diz-me que não tem escrito, porque não tem editora. É nestes momentos que eu percebo que esta piolheira é irreformável. PM
E ESPELHOS EM CASA? O PÚBLICO publicou ontem este artigo, chamado «A Política está Cinzenta». O timing não é muito adequado, mas em geral podemos dizer que é verdade: a política portuguesa é cinzenta. Mas quem assina este artigo? O colorido edil Macário Correia. Sabemos que a série continuará com um artigo de Carlos Castro intitulado «Há Imensos Gays por Aí». PM
MUDAM-SE OS TEMPOS: Seis da tarde. No auditório da FNAC do Chiado, passa La Grande Bouffe, de Marco Ferreri. Um filme que causou um enorme escândalo em 1976. Hoje, atrai (à borla) uma dúzia de pessoas, enquanto outras, no café, nem levantam a cabeça, comendo o seu croissant com queijo, indiferentes ao sexo, ao vótimo, à coprofilia. Mudam-se os tempos... PM
TEREI? O Ricardo elogia o meu desabafo a propósito do Lidiagate, comentando que eu «tenho tomates». Lembro-me da primeira vez que ouvi esse comentário: foi há muitos anos, era uma rapariga que falava, e parecia francamente surpreendida com o facto. PM
NEM DEUS É PERFEITO: Quando se começou a falar do livro de «conversas com Deus», não fazia ideia quem era Alexandra Solnado. Hoje, vi a sua vera efígie no jorrnal, anunciando uma sessão de autógrafos. Depois de ver a carinha da Alexandra, já percebo porque Jesus quis falar com ela: para lhe pedir desculpa. PM

terça-feira, maio 27, 2003

ESPAÑA: Uma rapidinha sobre as eleições espanholas. Nenhuma dúvida acerca da vitória política de Aznar: 9 comunidades autónomas, 34 capitais de província, votação em Madrid reforçada, perdas socialistas em Barcelona. Não creio que se possa discutir a vitória do PP, mesmo que, em percentagem de votos, tenha ficado um pouco abaixo dos socialistas. A nota dominante é o equilíbrio entre os dois principais partidos de Espanha e isto quando se temia uma hecatombe do PP depois de Aznar se ter metido até aos joelhos na bonita coligação que invadiu o Iraque há dois meses. A verdade é que se comparamos estes resultados com as últimas e recentes eleições belgas, percebemos que as escolhas feitas na guerra ao Iraque não têm qualquer relevância eleitoral. A Bélgica é um país dividido por 4 grandes partidos e nenhum deles conseguiu sozinho mais de 15% dos votos. Mas o caso belga tem outra explicações e veremos se, com o estado das coisas, o nosso não será parecido. Em Espanha, temos as legislativas aí à frente e nelas se decidirá se o futuro da Europa passa ou não por governos de esquerda. PL
OLHA O INFAME: Eu e o Tiago andámos na escola juntos. Ele desenhava melhor do que eu. Nenhum de nós tinha sorte com mulheres. A nossa amizade esteve uma vez em perigo quando, numa aula de trabalhos manuais, eu concebi um Buda argiloso que ele desancou sem pudor. O Tiago agora escreve coisas destas:

Simplesmente repugna-me fazer do cristianismo aquilo que ele nunca foi. Uma ideologia de convívio social, uma colectânea de arrotos optimistas, um lacaio barbeado do consenso.

A infâmia toca a todos. Um abraço, Tiago. PL
OUTRO MUNDO: Ando pela rua. Calor excessivo, umbigos à solta, nudez sem amor (esta tem dono). Nada me prende a atenção, nada me faz mudar de passeio, acelerar ou moderar o passo. Sou o típico, fiél caminhante walseriano. Quero ver tudo. Não me interessa nada. Mas eis que páro, eis que algo me desperta o interesse. Esta algo é um cartaz promocional do Forum Social Português. Leio: "Um outro mundo é possível". Um outro mundo é possível. Eu também acredito. Lá para os setenta (se não for antes), hei-de pensar seriamente nisso. PL
ESCONDER: A presunção de inocência é um princípio inatacável. É a única coisa certa diante de tanta poeira, tanta coisa mal dita, tanto patoá exagerado. Declarações de absoluta inocência juradas por amigos, merecem-nos todo o respeito mas valem o que valem. Lembrem-se que as pessoas escondem coisas. Que todos escondemos coisas. Coisas que nos desarrumam, que nos embaraçam, que nos comprometem. Não pensem que se pode conhecer absolutamente uma pessoa. Não pode. Revejam o Magnolia. PL
PORTUGAL: Pensem: em Felgueiras, temos o Portugal velho, do cacete e da sapatada; na Moderna, o Portugal novo, da corrupção finória e das influências; na Casa Pia, um Portugal escabroso até hoje inteiramente desconhecido. Não é fácil saber qual deles prevalece ou qual é o mais verdadeiro. A resposta, como diriam uns amigos meus, deve estar na simbiose. PL
SEM INTERMEDIÁRIOS: Hoje, 5 da tarde, edifício do Diário de Notícias, Alexandra Solnado recebe os fregueses para uma sessão de autógrafos. Está prometida conexão directa com o céu, sem intermediários e interferências. Está bem que é preciso comprar o livro mas isso é um pormenor sem importância. Não podemos ter tudo de graça. PL
'DASSE: Ocorre-me investigar um pouco o caso belga ne net, para poder traçar paralelos. Mas depois lembro-me que para isso tenho que pesquisar no Google «pedofilia». Desisto da ideia. Ainda tinha a Judite a levar-me o PC. PM
BLOGWATCH: Por lapso, não demos ontem o devido destaque a este artigo do Diário Económico, assinado por Carlota Mascarenhas. Até agora, tinham sáído alguns bons artigos no PÚBLICO (em vários dos suplementos), um texto apressado e cheio de incorrecções no DN e um texto para esquecer no EXPRESSO. Porque é que o texto do Económico é melhor que os textos do DN e Expresso? Porque a jornalista falou com alguns bloggers, evitando assim escrever disparates e inverdades. Uma pergunta: alguém está a fazer um dossier disto (além de nós)? Qualquer dia, a blogosfera portuguesa já tem um portfolio bem simpático. PM

segunda-feira, maio 26, 2003

MITOLOGIAS: Tínhamos decidido não dar mais tempo de antena à semi-polémica Cheirosas & Letradas. Não era, francamente, um tema muito letrado, e já começava a cheirar mal. No entanto, abrimos aqui uma excepção. Recebemos uma vigorosa carta de uma leitora italiana, que tem um incontornável ascendente sobre um dos Infames e que por isso chegou a ser aqui publicada - oh horror - sem o devido comentário. Vamos então à missiva, devidamente respondida.

Só agora, depois de um período de ausência, volto a ler a vossa Coluna. E constato que, segundo estatísticas correntes, feitas com particular atenção por PM, embora com aprovação de PL e JPC, existe uma incompatibilidade entre beleza e cultura no interior da comunidade intelectual feminina portuguesa. Esse dado, aliás, parece unir as opostas sensibilidades políticas dos vários blogs (indignação fictícia à parte). Só um infame – os meus parabéns! -, com um grande sentido estético, parece ter tido tomates (coisa rara na comunidade intelectual masculina) para dizer aquilo que é opinião comum. A forma como é descrita a comunidade intelectual feminina portuguesa aproxima-se de um Jardim Zoológico onde, entre um café e uma água tónica, deambula um número considerável de estranhas criaturas de leituras cultas e hálitos fedorentos. Parece que já Baudelaire nos tinha feito notar que só a estupidez é um cosmético da beleza. Mas não deixa de ser uma frustração, para os eternos sonhadores, terem sido desflorados pelas emoções vividas através dos grandes clássicos da literatura, sem reflexo no real! Mas onde poderão encontrar as vossas Rafaelas, Catarinas, Bárbaras, Marisas, num lânguido torpor cuja voluptuosa carnalidade beija as vossas razões? Onde se encontra a mulher linda que emana pura luxúria e cuja sensualidade emerge dos seus lábios carnudos? Onde se encontra a mulher livre, ambiciosa, elegante, bela, sedutora, envolta num eloquente erotismo, onde é possível abandonar-se, embriagando-se na sua áurea carnal? Não conheço a comunidade intelectual feminina portuguesa, mas concordo com PM: aí é impossível encontrar tal mulher. Mas digo mais: tenho dúvidas que a possamos encontrar na rua, entre as gentes, ou nos cafés bem frequentados, entre luz e sombras de mamas siliconadas. Talvez uma dessas, a Rafaela, possa ser encontrada num museu, entre as cores de Tâmara de Lempicke (pintora polaca) que a retrata tão bela na sua nudez (considerada pelo Sunday Times como um dos mais belos nús do século XX). E as outras mil mulheres da vossa fantasia? Mulheres assim, queridos Infames, não existem, porque mulheres assim não nascem. Inventam-se - um bocado por escolha, um pouco por necessidade, através das páginas de uma revista, nos flashes de um fotógrafo que as retrata através de mil artifícios, no pincel de um artista ou nas palavras de um escritor. Mas então, perguntam vocês, a beleza não existe? Existe, meus queridos, claro que existe. Mas é uma beleza humana, real – e, como toda a realidade, imperfeita, única e irrepetível. Haverá algo de mais belo do que a sensualidade de uma imperfeição num corpo harmónico? Existirá algo de mais erótico do que uma desarmante simplicidade? Existem apenas mulheres. Mulheres em busca de si próprias, prisioneiras das próprias imagens (belas ou feias que sejam), de ex-loiras a ex-morenas, de ex-vamps a ex-estrelas; mulheres que olham em volta, talvez à procura de um espelho que lhes restitua uma identidade definida; que são uma, nenhuma e cem mil. Mulheres desejosas de aparecer despidas, para desaparecerem e reaparecerem vestidas de si próprias. Mulheres contraditórias: crianças adultas, estúpidas inteligentes, putas santas. Mulheres que olham para si e se envergonham e depois se reconhecem, pois voltam a olhar-se ainda e gostam. Não existe nada de mais lindo do que o olhar sofisticadamente inteligente, porque culto, de uma mulher com sabedoria de si própria que emana a sua personalidade através de uma genuinidade tão autêntica porque desejada. Oh!, a beleza, queridos rapazes, é um instante e muitas vezes foge-nos das mãos. A beleza vem e vai: basta colhê-la mas não levá-la a sério. Lindas ou cultas? Lindas e cultas, eis as mulheres de hoje! E se vocês estão a perguntar se a pessoa que escreve é linda e/ou culta, eu respondo e deixo que sejam vocês a julgar: sinto-me linda quando estou bem, quando me encontro à vontade com as pessoas que amo. E é nesse momento que a pele é perfeita; os cabelos, estupendos; o corpo, ligeiro. Tudo o resto, queridos, è un mare di cazzate. (Maria Bocchichio)

Cara Maria: obrigado pela tua carta, como sempre culta e com um estilo recomendável (e ainda te queixas do teu português). É bonito ver uma compatriota de Dante descer das alturas do Paradiso para o semi-vernáculo polémico de «putas», «tomates» e «mamas siliconadas». É sempre bom ver alguém de uma civilização superior dignar-se a descer ao nosso nível chulo e atascado. Grande parte do que dizes já foi por mim respondido e desmentido: não tenho nenhuma «estatística» (só a minha infeliz experiência pessoal e a dos meus conhecidos); não postulei nenhuma «incompatibilidade entre a beleza e a cultura» (apenas disse que é um fénomeno raro); não creio que essa seja uma «opinião comum» (se fosse, não se percebia a polémica), embora seja mais comum do que as pessoas admitem. O interesse da tua carta começa a partir daqui, na questão importantíssima da «invenção da mulher». Dizes, e bem, que o(s) paradigma(s) da beleza feminina e da própria feminilidade devem muito a elaborações (masculinas) sobre o assunto, e citas as grandes musas dos grandes poetas e pintores. Nisso tens, obviamente, razão. Quase tudo é cultura, e certamente a questões de género e de estética têm forte dimensão cultural. Mas quero anotar duas coisas. A primeira é a desconfiança face, nomeadamente, à «literatura» quando a literatura exprime opiniões politicamente incorrectas. A «literatura» de Baudelaire é, sem dúvida, maravilhosa, mas o que Baudelaire escreve sobre as mulheres, oh não, isso pertence à abominação. Conheço bastante bem esse double standard face à literatura. A segunda é que nenhum dos Infames nega a sua condição de indivíduos submergidos no universo da literatura, com todas as suas glórias e efeitos secundários, entre os quais se conta, com certeza, uma enorme «estetização» e «idealização» da realidade, y compris les femmes. Mas isso não justifica, parece-me, que descaias na sub-literatura feministas segundo o qual a beleza é um «mito». Deixa essas patetices para a Naomi Wolf. A beleza é uma construção? Com certeza, e Baudelaire disse-o melhor que ninguém. É um estatuto? Um valor de troca? Um imaginário? Sem dúvida. Mas todos nós, cara Maria, sabemos (mesmo com as nossas discordâncias subjectivas) o que é o «belo» e o «feio», na arte como na vida. E também nos homens e nas mulheres. A beleza é um dado de facto, mesmo se mutável. A não ser que adoptes uma tese de que tudo são construções e mitologias, sem realidade dentro, e nesse caso o amor é a construção e a mitologia número um da humanidade. Mas eu sei que não queres ir por aí. A «comunidade intelectual feminina portuguesa» é, esteticamente, um horror. É a minha opinião. É a minha experiência. Talvez as mulheres bonitas vejam valorizada socialmente a sua beleza, e sintam que não precisam de queimar pestanas com o Carlos Fuentes, não faço ideia. Mas a verdade é que não têm conta os sustos estéticos que um literato português apanha no seu contacto com o outro sexo. Já admiti, de resto, que o mesmo se passa provavelmente com os homens, a começar por yours truly, mas isso não me preocupa grandamente, como compreenderás. A tua coda feminista é, francamente, uma espécie de filosofia estética «new age» que, desculparás, abomino. Além de que, Maria, tu estás em péssima posição para falares neste tema. E porquê? Porque és italiana. E toda a gente sabe que esteticamente a Itália é o sétimo céu. Em Itália toda a gente é bonita, e mesmo quem não é pelo menos veste-se bem. Em Roma vi lojistas bonitas, passeantes bonitas, adolescentes bonitas, mães de família bonitas, polícias sinaleiras bonitas, condutoras de autocarro bonitas e recepcionistas de hotel bonitas. Para não falar, é claro, das actrizes e das apresentadores de televisão. Conheço mal o meio intelectual italiano, mas acredito que em Itália até as escritoras e intelectuais são mais giras que a Natasha Henstridge. Mas estás na Lusitânia, Maria, e tens que ver as coisas à nossa dimensão. Há mulheres portuguesas bonitas? Há, lindíssimas. Se andares pela noite, são mais que as mães. Mas na Gulbenkian? No Pen Clube? Na APE? Na Ler Devagar? Na Cinemateca? Caríssima Maria, aí vivo eu, e te garanto que aí a estética foi de férias. Deixa-me cá com o meu «mare di cazatte» e com as minhas lamúrias justificadas, que nem todos podemos ser desse optimismo resplandescente. Andar por cá é bastante difícil e escuro. Baudelaire, suponho, concordaria. PM